O início de 2021 foi diferente para a família Baasch nas redes sociais. Em vez de memes ou pegadinhas para brincar com os amigos, os grupos de WhatsApp receberam a mesma imagem: a foto do menino Matheus, de quatro meses de idade. Sorrindo, ainda sem dentes, apenas com a língua aparente e a cabeça apoiada sobre a palma da mão do pai, estendida como um travesseiro. No topo, a frase “doe sangue, salve meu filho”, e o telefone para agendar a coleta no Hospital Santo Antônio, do Complexo Hospitalar Santa Casa, em Porto Alegre.
A publicação viralizou de tal forma que o Banco de Sangue da Santa Casa registrou números recordes para o período. De acordo com a instituição, somente em resposta à campanha, 120 pessoas procuraram o local para efetivarem suas doações, por dia. Em meio a feriados, a média diária é de 40 pessoas, três vezes menos do que o atingido.
- É a generosidade de um grande número de doadores. Algumas campanhas como a do Matheus tem a felicidade de viralizarem e sensibilizarem muitos doadores. Mas devido a validade curta do sangue, o alívio nos estoques é de pouco mais de uma semana, geralmente - afirma o tio do garoto, Thiago Baasch, 39 anos.
Matheus tem deficiência em uma enzina que protege o fígado. Quando tinha dois meses de idade, passou por uma cirurgia para contornar a situação, mas não obteve o resultado esperado. Foi entubado, teve uma hérnia e o quadro se agravou.
Na última segunda-feira (4), pouco mais de uma semana após ser internado na capital gaúcha, recebeu parte do fígado do pai, o empresário catarinense Heron Baasch, 32 anos. Para esse procedimento, foi necessário um grande número de transfusões, o que justifica a mobilização e reforça o apelo diário dos hemocentros.
- Muitas vezes, como no caso do pequeno Matheus, a arrecadação de sangue se inicia semanas antes da cirurgia, e continua depois. A necessidade por parte de novos pacientes, que vão chegando não termina nunca – complementa o tio.
Segundo o hospital, pai e filho estão em recuperação na UTI, retomada gradual e observada constantemente. A família está ansiosa pela ida de Heron para o quarto, quando terão o primeiro contato físico desde a intervenção.
Ajuda a menino do Pará, também internado em Porto Alegre
A família Baasch vive em Florianópolis, Santa Catarina. O bebê veio ao RS de avião, um dia após o Natal, devido a uma infecção generalizada. Como o caso era de alta complexidade, eles receberam o apoio de uma aeronave do Sistema Único de Saúde (SUS), que realizou o traslado de urgência.
Enquanto aguardavam pela cirurgia em terras gaúchas, os catarinenses conheceram outro paciente, que percorreu um caminho ainda maior até o sul do país. Caio Alexandre Ferreira Sousa, de nove meses de idade, enfrenta uma situação semelhante à de Matheus, e também precisa de um transplante hepático, com transfusões constantes. Ele veio de Santarém, no Pará, trazido pela mãe, Diana da Silva Ferreira, 35 anos. A viagem de quase quatro mil quilômetros foi acompanhada por um temor: o de ficarem desassistidos em Porto Alegre.
- Aqui, a gente não conhecia ninguém, e não temos nenhum parente. A família do Matheus tem me dado um apoio muito grande. Levam minhas roupas para lavar, perguntam o que a gente está precisando. Graças a Deus, ao chegar em Porto Alegre encontramos pessoas boas - afirma Diana, que passa dias e noites no hospital.
Na mobilização realizada pelos Baasch, alguns voluntários doaram quantias em dinheiro, e esse valor foi repassado aos paraenses, que estão em condições financeiras precárias. Diana e o marido perderam seus empregos na pandemia. Ele trabalhava na construção civil e ela já foi vendedora, doméstica, atendente de padaria, entre outras funções das quais pouco se lembra atualmente. Até dezembro passado, recebiam o auxílio emergencial, que foi extinto pelo governo federal. O casal tem ainda outros cinco filhos.
O transplante de Caio seria realizado na próxima semana, mas uma trombose no fígado do pai o impediu de ceder parte do seu órgão. A mãe passa, agora, por uma bateria de exames para verificar se há compatibilidade de assumir o papel de doadora.
Outra opção para o menino é a chegada do órgão de um paciente com morte encefálica.
- Dói só de pensar. Quero a vida do meu filho, mas não quero que ninguém perca o seu – repete a mãe de Caio.
Uma campanha também foi criada com o intuito de captar mais bolsas para o Banco de Sangue da Santa Casa, e um novo viral nas redes sociais é o desejo de todos que estão empenhados na iniciativa.