
Discordâncias entre a prefeitura de Porto Alegre e o governo do Estado podem impedir a transferência de serviços de saúde da Capital para a gestão estadual. A mudança havia sido acertada na semana passada, mas um impasse entre as duas partes ao longo dessa semana fez o acordo refluir.
A oferta para assumir serviços de média e alta complexidade foi feita pelo governador Eduardo Leite no dia 17, em reunião com o prefeito Sebastião Melo e outros gestores municipais da Região Metropolitana. No mesmo dia, Melo enviou ofício ao Palácio Piratini comunicando o aceite.
No entanto, há divergências de entendimento entre as duas partes sobre o que será repassado.
A prefeitura diz que aceita o acordo se o Estado assumir todos os serviços de média e alta complexidade. Além da gestão dos hospitais, isso inclui consultas com especialistas, exames de imagem, como tomografia e ressonância magnética, cirurgias e gestão de pronto-atendimentos.
No entanto, o governo do Estado almeja assumir a gestão dos hospitais municipais (HPS e Presidente Vargas) e contratação dos serviços de hospitais filantrópicos, como a Santa Casa.
No ofício enviado ao governo, Melo indica que aceita que o Estado "assuma a gestão da média e alta complexidade hospitalar do município."
Pedido por recursos
A troca na gestão da saúde foi oferecida por Leite após meses de reclamação da Capital pela falta de recursos para a área. Há cerca de três meses, Porto Alegre vem solicitando ao governo do Estado e ao governo federal o aumento nos repasses em razão do crescimento da demanda e a lotação dos hospitais.
Entre os fatores que contribuem para esse cenário, estão a procura de pacientes de outras cidades por atendimento, a redução de verbas do programa Assistir e os problemas em hospitais de cidades vizinhas, como Canoas e Viamão e os prejuízos econômicos causados pela enchente.
Além do quadro atual, o pedido leva em conta a proximidade do inverno, que tende a aumentar a procura por atendimentos hospitalares em razão das doenças respiratórias.
No início de abril, prefeitos e representantes de 17 municípios levaram ao ministro da Saúde, Alexandre Padilha, o pleito por aportes adicionais de recursos para a Região Metropolitana. Padilha prometeu uma resposta, mas ainda não deu retorno aos prefeitos.
Níveis críticos
Enquanto o impasse entre prefeitura e Estado persiste, a saúde de Porto Alegre opera em níveis críticos, com todas as emergências de alta complexidade superlotadas.
O pior cenário é no Hospital de Clínicas, que tem 45 leitos, mas atende 113 pacientes nesta sexta-feira (25).
Porto Alegre tem 98% dos leitos clínicos de hospitais ocupados e, nas unidades de pronto atendimento (PAs e UPA Moacyr Scliar), a operação está cotidianamente acima da capacidade.
Diante da proximidade do inverno, a prefeitura afirma que não tem condições de manter todos os serviços a partir de maio, por falta de recursos. Por isso, o município promete cortar a oferta de serviços à população.
O município reivindica um aporte de R$ 16 milhões para a Operação Inverno, que seriam aplicados na compras de leitos em hospitais privados, manutenção de serviços, aquisição de medicamentos e pagamento de funcionários.
No entanto, a Secretaria Estadual da Saúde (SES) afirma que não possui orçamento para isso. No mês passado, o governo prometeu repassar cerca de R$ 16 milhões à Capital, mas esse recurso será aplicado na adaptação e reforma de prédios das unidades de pronto atendimento.
Os problemas da Capital estão interligados com a falta de atendimento em outras cidades da Região Metropolitana. Com isso, e eventual corte de serviços tende a prejudicar pacientes de outras cidades, como Canoas, Sapucaia do Sul, Gravataí, Viamão e Alvorada.
Em Sapucaia do Sul, a prefeitura anunciou o fechamento de 60 dos 220 leitos do hospital municipal por falta de financiamento. Em Canoas, o município afirma que os serviços terão de ser "readaptados para o orçamento".
A SES afirma que lançará uma Operação Inverno em âmbito estadual na primeira quinzena de maio.
Sem avanços
O último encontro para discutir o repasse da gestão da saúde da Capital ao governo do Estado ocorreu na quarta-feira (23), quando se reuniram os secretários Fernando Ritter (município) e Arita Bergmann (Estado).
A conversa terminou sem definição de prazo ou solução concreta para a Operação Inverno.
Um grupo de trabalho foi formado para preparar a documentação necessária para o processo de transição, mas ainda não está claro se isso vai ocorrer, em razão do impasse político. Nova reunião entre Ritter e Arita está marcada para a próxima quarta-feira (30).