É notória a nossa tendência de evidenciar os defeitos alheios em detrimento das qualidades presentes em amigos, parentes e colegas. No mínimo, rende assuntos acalorados. E faz com que nos sintamos paladinos da verdade e da razão. É uma inclinação contra a qual devemos lutar, como um exercício filosófico para a depuração do caráter. Não é fácil, pois exige contenção, autocrítica e o desejo de reparar essas fissuras da alma que nos tornam tão menos interessantes. De minha parte, tenho feito um esforço continuado para absorver com mais generosidade o comportamento das pessoas com quem convivo. O caminho tem sido o de considerar o que motiva suas ações. Conceder-lhes o crédito da boa intenção, principalmente quando não se coadunam com a nossa visão de mundo. O resultado é sempre satisfatório, instaurando a leveza nos relacionamentos que poderiam ser minados com a desconfiança e uma pretensão de superioridade.
“Continuo inclinado a elogiar; a ver a doçura, não o amargor.”
É agradável estar ao lado de quem queremos bem sem apontar o tempo todo o que nos desagrada e, secretamente, gostaríamos de mudar. Aprender a tolerar é uma postura que normalmente encontra a reciprocidade no objeto de destinação. É como se isso desarmasse nosso interlocutor e o conduzisse a um olhar mais generoso na análise das miudezas do dia a dia. Pois quase toda a nossa existência é feita desses pequenos atos que depois se tornam material de observações nem sempre abonadoras. Entre os casais, então, isso parece ser a melhor conduta para a saúde emocional. Não se apegar a picuinhas: a pasta de dente aberta, a toalha no chão, o calçado esquecido no meio do corredor. São detalhes que costumam acabar com o encantamento que nos fez escolher Maria, Carlos ou Clarice para estar conosco. Ver com positividade, exaltando o esforço, a determinação em se tornar melhor. Somos todos propensos a errar, e devemos recolher dessas escolhas equivocadas material para refinar atitudes futuras. Apostar na capacidade de redenção é uma prova inconteste de que entramos na vida adulta, com seus percalços e maravilhas.
Seguidamente me dizem: "Mas tu gostas de tudo, o que é que te decepciona, afinal?" Muitas coisas me desapontam. A diferença talvez esteja no fato de não lhes dar o espaço que normalmente elas ocupam no nosso cotidiano. Fazer com que as conversas não sejam um duelo, ceder nos nossos pontos de vista, relativizar. Acolher com bondade o que antes merecia apenas o comentário ácido. A tensão e o cansaço é que costumam nos transformar em juízes severos. Para que serve tudo isso? Mais adiante precisaremos dessa condescendência que negamos hoje.
Seremos mais felizes se abandonarmos o chicote que busca constantemente a correção. Continuo mais inclinado a elogiar. A ver a doçura, não o amargor. Minha profissão de fé haverá de ser sempre essa.