O verde se destaca na fotografia acima, mas a experiência ao vivo é bem mais intensa: a tela emite tanta luminosidade que parece envolver quem para diante dela. Aos poucos, os olhos se acostumam e começam a perceber as marcas de pincel e espátula, além de entrever o fundo prateado. Ele conversa com a tela suspensa ao lado, onde as camadas se invertem: a prata vai para a superfície e o verde está no fundo. Sem título, esse díptico de 2015 é um convite de passeio endereçado ao olhar do visitante:
– Eu acho que o objetivo de um pintor é fazer com que o olho circule pelo quadro. Se o olho parar, o trabalho é um fracasso – diz Sister.
Encontros assim são propiciados pela exposição O Sorriso da Cor e Outros Engenhos, primeira individual do artista paulista em Porto Alegre. O assunto central nas 22 obras do pintor associado à Geração 80 – creditada a um resgate da pintura no Brasil – é a luz expressa em cor. A técnica apurada e as sobreposições de camadas de tinta fazem com que os trabalhos, muito brilhantes, saltem das paredes brancas do Instituto Ling para receber os visitantes, algo que a curadora da exposição, Virgínia Aita, relaciona liricamente a um sorriso.
– É uma cordialidade, uma abertura. E também há uma gentileza na abordagem da cor que evita contrastes abruptos, trabalha com as sutilezas – avalia Virgínia.
Por volta de 1996, Sister sentiu necessidade de projetar a pintura ainda mais no espaço – ecoando o impulso dos minimalistas e dos neoconcretos. A partir daí, passou a criar objetos tridimensionais, como caixas, ripas e pontaletes, também expostos no Ling. Manteve, entretanto, um pensamento próprio da pintura. Nas caixas (foto abaixo), cada pedaço de madeira ganha uma cor, propondo que o visitante caminhe ao seu redor e observe como as tonalidades mudam de acordo com a incidência de luz e a interação entre uma cor e outra.
– As cores estão na vertical porque a horizontalidade sempre sugere paisagem. Assim, o trabalho fica mais impessoal, não sugere significados. Ou seja, a cor fala por si – analisa a curadora, citando algumas referências de Sister, como Barnett Newman, Ellsworth Kelly e Willys de Castro.
Jornalismo e militância política
Nascido em 1948, Sister pinta desde 1964. Durante toda a vida, conciliou a arte com a carreira de jornalista, atuando em veículos como o jornal A Última Hora, a revista Veja e as emissoras de TV Band, Cultura e Globo. Sua trajetória também é marcada pela militância política. Conta que, em 1970, chegou a ser preso por integrar o Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR):
– Passei um mês no DOPS, fui torturado. Depois, passei 19 meses no Presídio Tiradentes. Lá, minha mulher me levava um caderninho e crayon, então eu desenhava todo dia.
A galeria paulista Nara Roesler prepara uma exposição com esses desenhos e também telas figurativas que estão entre os primeiros trabalhos de Sister. Intitulada Imagens de uma Juventude Pop – Pinturas Políticas e Desenhos da Cadeia, será aberta em 10 de agosto.
– É uma exposição apropriada aos tempos que a gente vive, quando se nega que houve ditadura e tortura – afirma o artista, ressalvando que a produção exibida em Porto Alegre é distinta. – Claro que sempre algo é incorporado na gente. Mas meu trabalho atual não tem um pensamento político. Tem um pensamento de liberdade.
O Sorriso da Cor e Outros Engenhos
- Exposição de Sérgio Sister
- Curadoria: Virgínia Aita
- Abertura nesta terça-feira (30/7), às 19h. Na ocasião, o artista e a curadora farão uma conversa aberta ao público sobre a exposição.
- Visitação: de segunda a sexta-feira, das 10h30min às 22h, e sábados, das 10h30min às 20h30min, até 1º de novembro. Entrada franca.
- Galeria do Instituto Ling (Rua João Caetano, 440), no bairro Três Figueiras, em Porto Alegre.