
Passadas 24 horas do temporal que trouxe no último dia todas as "águas de março" sonegadas ao longo do mês, os porto-alegrenses e moradores da Região Metropolitana têm a sensação de que o despreparo era maior do que se imaginou logo depois da ventania e da bomba d’água. As entrevistas dos responsáveis por serviços afetados pela chuva passam a impressão de que o básico não foi feito — e aqui não se fala de grandes projetos, mas de trabalho de manutenção das redes elétricas, dos bueiros, das bocas de lobo, das casas de bombas.
Comecemos pela CEEE Equatorial. A empresa não tem culpa se o vento chegou a 111km/h, mas o resultado é que mais de 300 mil residências em algum momento ficaram sem energia e 58 mil estão assim até o final da tarde desta terça-feira. Quem circula pela cidade sabe que a Equatorial tem postes inclinados há meses, alguns sustentados pelo acúmulo de fios que ninguém se responsabiliza por tirar.
A falta de energia é a justificativa do Dmae para a casa de bombas número 16 não ter funcionado, alagando a Cidade Baixa, e para as estações de tratamento de água Moinhos de Vento, São João e Belém Novo terem parado de funcionar, o que deixou milhares de famílias sem água em diferentes bairros de Porto Alegre. Será esta a nossa sina cada vez que chover ou desabar um temporal?
O diretor-geral do Dmae tentou consolar os afetados pelos alagamentos com a explicação de que em outras áreas da cidade, como Sertório e Lindoia, não ocorreram problemas. Os ouvintes do Gaúcha Atualidade correram a explicar que o motivo não tem relação com as bombas (agora com geradores), mas com a escassez de chuva. É que o dilúvio registrado na Zona Sul e Central não chegou à Zona Norte.
Na Avenida José de Alencar, que o Dmae diz tratar como prioridade, a coluna identificou em bocas de lobo (melhor dizer "de jacarés", pelo tamanho) sacos plásticos, uma planta de pelo menos 20 centímetros e até um cavalete da EPTC. Se a população não cuida, como evitar alagamentos?
Ao longo do dia, sinaleiras em cruzamentos movimentados seguiam apagadas e sem agentes para orientar o trânsito. Exemplo? Ao meio-dia, no cruzamento da Ramiro Barcellos com a Protásio Alves, os semáforos estavam inativos, e atravessar a avenida virou uma roleta-russa pela ausência de azuizinhos.
Para não ficar só nas obrigações da prefeitura, é preciso relembrar que os alertas da Defesa Civil, na véspera, não foram levados a sério nem pelo governo do Estado, que só cancelou um evento ao ar livre no Morro de Santa Tereza quando os convidados (entre eles o diretor-geral do Dmae) já estavam a caminho.
Até aqui, o que mais se viu foram reuniões para decidir como tocar a reconstrução do Estado em geral e de Porto Alegre em particular. E os R$ 6,5 bilhões liberados pelo governo federal para as cobras de prevenção às cheias dormindo (e rendendo) à espera dos projetos.