A decisão da Meta de encerrar o sistema de checagem de fatos pode ocasionar a suspensão do Facebook e do Instagram no Brasil, como ocorreu com o X (antigo Twitter) no ano passado? Essa é uma das principais dúvidas dos usuários desde o anúncio de Mark Zuckerberg, CEO da empresa responsável pelas plataformas, na última terça-feira (7). Especialistas acreditam que a mudança — exclusiva aos Estados Unidos, por enquanto — não causaria a suspensão das plataformas imediatamente, desde que não viole a legislação brasileira.
A confusão entre os usuários aumentou após Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmar, em um evento na quarta-feira (8), que o STF não vai permitir que as "redes sociais continuem sendo instrumentalizadas dolosa ou culposamente, ou, ainda, somente visando o lucro, para discursos de ódio." A fala foi referente ao papel das plataformas nos atentados de 8 de janeiro de 2023.
Mudança pode chegar ao Brasil?
Por enquanto, a decisão afeta somente os Estados Unidos. O Ministério Público Federal de São Paulo oficiou a Meta, na quarta-feira (8), para saber se existe a possibilidade de essa mudança ser implementada no Brasil futuramente. Especialistas acreditam que há chances de a empresa estender a decisão para outros países.
— Existe a possibilidade de o Brasil suspender o acesso ao Facebook e ao Instagram, sim. Mas não vejo motivos para isso ocorrer simplesmente pelo fato de que o Mark Zuckerberg disse que não iria mais fazer essa checagem de fatos. Para impedir o funcionamento da Meta, seja por meio do Facebook, seja por meio do Instagram, no Brasil, só se a empresa se engajasse em comportamentos contrários à nossa legislação — afirma Manoel Gustavo Neubarth Trindade, professor dos cursos de Direito e de Relações Internacionais da Unisinos.
O que diz a lei brasileira
No Brasil, a legislação que se aplica às redes sociais é o Marco Civil da Internet, a Lei N.° 12.965 de 2014. O artigo 19 exige uma ordem judicial para que plataformas sejam responsabilizadas por conteúdos de terceiros. A regra, por vezes, é criticada porque pode ser considerada uma medida demorada para combater conteúdos prejudiciais, como fake news ou discurso de ódio.
— Esse artigo tem essa mediação pelo judiciário. E as redes sociais também têm liberdade para estabelecer suas próprias regras de moderação de conteúdo. Para Mark Zuckerberg, e para muitas outras pessoas, esse é um modelo ideal, que garante a liberdade de expressão e impede a censura arbitrária. Mas, por outro lado, se discute se não é muito permissivo. É por isso que se discute a aprovação de uma nova lei, que é o PL das Fake News — contextualiza Marcelo Cárgano, advogado especialista em Direito Digital.
É pelo fato de o Brasil não ter uma lei específica sobre o tema que os especialistas acreditam que, se a mudança fosse aplicada em território brasileiro, não causaria a suspensão das plataformas imediatamente. Cárgano garante que, na Europa, onde há uma regulamentação para as redes sociais, o cenário seria diferente:
— A Europa já se manifestou. Falou que existe uma lei, que chama Digital Services Act (DSA), que já está em vigor, e que exige que as plataformas demonstrem eficácia na moderação de conteúdo. Que conteúdos com impacto em menores de idade, discurso de ódio e de ataque à democracia têm que ser retirados. Então, se for para lá, não vai tirar do ar imediatamente, mas a Meta terá que demonstrar que o novo sistema é igualmente protetivo — explica o advogado.
O Ministério Público Federal deu 30 dias para a Meta informar se a mudança afetará o Brasil, quando a nova medida poderia ser aplicada em território nacional e quais as violações passarão a ser definidas como legais ou graves pela empresa. O professor da Unisinos defende que o documento nada mais é do que um pedido de esclarecimento.
— São informações requisitadas. Não é uma ordem impositiva como seria uma ordem judicial. Isso é feito no âmbito de um inquérito já existente. Esse ofício foi encaminhado dentro de um inquérito civil que vem tramitando desde 2021 e que apura a responsabilidades das big techs sobre os conteúdos postados — acrescenta Trindade.
Entenda o caso
Por meio de uma publicação no Instagram, Zuckerberg anunciou que o programa de verificação de fatos será encerrado e que a Meta deverá adotar as "notas da comunidade", um recurso similar ao implementado pela plataforma X. O CEO informou que o foco será em filtros para combater violações legais e de alta gravidade. Casos de menor gravidade vão depender de denúncias para serem filtrados. Para o empresário, a mudança busca restaurar a "liberdade de expressão".