Impactado pela enchente e pela alta do juro no país, o mercado imobiliário em Porto Alegre terminou 2024 desacelerado no quesito de novos lançamentos. Foram 2.848 imóveis residenciais verticais lançados no mercado entre janeiro e dezembro do ano passado, representando queda de 10,2% em relação a igual período de 2023, quando foram lançadas 3.174 unidades. Os dados são da pesquisa Panorama do Mercado Imobiliário, realizada pelo Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado (Sinduscon-RS) em parceria com a Alphaplan – Inteligência em Pesquisas e a Órulo. O levantamento não contempla imóveis do Minha Casa Minha Vida.
Outro recuo foi nas vendas de imóveis verticais na Capital, que baixaram 7,9% no ano passado. Foram 4.490 comercializações em 2024, frente às 4.877 do ano anterior. Apesar disso, o valor arrecadado com essas unidades, o que setor chama de VGV, foi o mesmo de 2023: R$ 4,8 bilhões.
Vice-presidente do Sinduscon-RS, Marcelo Guedes celebra o resultado, mesmo em um ano atípico para o setor, e explica que o fato ocorreu devido às vendas de unidades em empreendimentos de alto padrão, onde os apartamentos são mais caros.
— Quando a Selic sobe, como está acontecendo desde o ano passado, o juro fica mais caro e afasta o cliente que faz financiamento. Sendo assim, o mercado acabou se concentrando em lançamentos de padrão mais elevado, de dois ou três dormitórios, que têm valor mais elevado — avalia Guedes, que também é vice-presidente de Operações da Melnick.
— Como tivemos uma reversão de expectativa macroeconômica no segundo semestre, acabou que o mercado lançou menos do que vinha lançando em anos anteriores. Por conta da enchente, o ano ficou mais curto, prejudicando o calendário de lançamentos. Com a subida do juro, muitas empresas também acabaram segurando os lançamentos que fariam — acrescenta o executivo.
Maior construtora do Rio Grande do Sul, a Melnick apostou, no ano passado, em empreendimentos de alto padrão nos bairros Auxiliadora e Moinhos de Vento. São regiões que figuram na lista de bairros com mais lançamentos e com maior VGV (veja o ranking abaixo).
Somente em três lançamentos de prédios no entorno da Rua 24 de Outubro, a empresa investiu R$ 250 milhões, projetando alcançar R$ 400 milhões com as vendas dessas unidades. Nos planos para 2025, a Melnick pretende manter essa estratégia.
— No ano passado, lançamos menos do que planejávamos devido aos fenômenos da enchente e do juro alto. Nos concentramos no segmento de alto e altíssimo padrão, em que esse perfil de cliente acaba fazendo a aquisição com recursos próprios. Ele é muito menos dependente de financiamento — analisa Guedes.
CEO da Cyrela Goldsztein, Rodrigo Putinato diz que, dos quatro empreendimentos lançados pela construtora em 2024, dois já tiveram todas as suas unidades vendidas. Ambos são de apartamentos compactos, uma tendência que a empresa seguirá apostando.
— Na nossa programação de 2024, lançaríamos seis produtos. Como tiveram os problemas da enchente, um deles não conseguimos encaixar, então vamos lançá-lo agora no primeiro semestre de 2025. E outro produto (que seria lançado em 2024) deixaremos de seguir com ele, pois estava em uma posição muito perto do Guaíba, então distratamos o terreno — diz Putinato.
No primeiro semestre deste ano, a Cyrela prevê lançar um empreendimento com unidades maiores, de 170 metros quadrados, mas também investirá em mais três edifícios de moradias compactas.
Estoque menor
O levantamento do Sinduscon-RS também mostra que, com a queda de lançamentos superior à das vendas, 2024 fechou com o menor volume de imóveis novos em estoque na série histórica, com 4.802 unidades. A pesquisa começou a ser feita em 2020, quando a cidade estava com 6.384 imóveis disponíveis para venda.
— O mercado freou, ficou mais atento, muito em razão da questão da taxa de juro alta. As empresas acabaram segurando esses empreendimentos. Isso afeta o investimento privado e o próprio consumidor, tanto que a demanda por aluguéis subiu. Como os lançamentos frearam mais do que proporcionalmente, foi consumido o estoque que estava presente na cidade — diz Tiago Jung, sócio-diretor da Alphaplan Inteligência em Pesquisas, que colaborou no levantamento.
Já o vice-presidente do Sinduscon-RS, Marcelo Guedes, avalia que, com estoque menor, surgirão lacunas para novos lançamentos em 2025.
— Em um mercado estocado, mesmo se o juro estiver baixo, as construtoras não lançam empreendimentos, porque precisam escoar aquilo que já haviam lançado. Agora, em 2025, elas precisam encontrar lacunas de segmentos que possuem demanda e estoques menores — analisa Guedes.
Por outro lado, o professor da Faculdade de Arquitetura e da pós-graduação em Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Eber Pires Marzulo avalia que o mercado imobiliário pode estar repensando o ritmo de novos lançamentos, que acelerou nos últimos anos.
— Houve um processo muito acelerado de novos lançamentos em Porto Alegre. Há muito estoque de novos imóveis, mas também de mais unidades antigas que estão paradas à venda. Este cenário talvez faça com que o mercado pare e olhe com mais atenção para os imóveis que ainda tem em estoque — avalia o professor.
A expectativa do setor para 2025 depende de como vai se comportar a taxa de juros. Na última quarta-feira (29), o Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central, elevou a taxa básica de juros (Selic) de 12,25% para 13,25% ao ano.