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O ajudante de ordens da Presidência durante o mandato de Jair Bolsonaro, Mauro Cid, disse, em depoimento no Supremo Tribunal Federal (STF), que integrantes do agronegócio pressionaram o governo para que fosse consumado um golpe de Estado no país. Nesta quinta-feira (20), o ministro Alexandre de Moraes, relator do caso na Suprema Corte, retirou o sigilo de vídeos dos depoimentos de Cid.
Durante o interrogatório, Moraes questionou Cid sobre uma mensagem que ele teria recebido, em 26 de dezembro de 2023, do tenente Aparecido Andrade Portela — suplente da senadora Teresa Cristina (PL-MS), ex-ministra da Agricultura no governo de Bolsonaro. Portela foi um dos 40 indiciados pela Polícia Federal (PF), em dezembro de 2024, por suspeita de participação em uma tentativa de golpe de Estado.
No depoimento, Moraes lê a troca de mensagens entre Portela e Cid:
Portela: — O pessoal que colaborou com a carne está me cobrando se vai ser feito mesmo o churrasco.
Mauro Cid exclama: — Vai sim. Ponto de honra. E complementa: nada está acabado ainda da nossa parte.
Depois de ler o trecho, Moraes questiona o delator:
— Obviamente, não era a picanha que não estava acabada ainda, não é, coronel? — questiona o ministro.
Moraes diz que as investigações apontaram que Portela visitou Bolsonaro 13 vezes. Mauro Cid responde que lembra do diálogo e acrescenta que o militar ficou em Brasília durante, pelo menos, dois meses.
Acampamentos e "carne"
Cid diz que os manifestantes que ficaram 70 dias acampados em frente aos quartéis estavam cobrando um posicionamento do governo e pressionando pela tomada do poder pelas Forças Armadas.
— A minha resposta era no sentido de que o presidente sempre falava a mesma coisa: até dia 31 (de dezembro) vai aparecer alguma coisa. Até o dia 31, eu vou encontrar uma fraude nas urnas. É o que o pessoal estava esperando — relatou.
Enfático e ainda não convencido com as respostas, Moraes lê novamente o diálogo, salientando seus questionamentos para Mauro Cid.
— Quem é o pessoal? "Carne" é o dinheiro. Ou seja: quem estava financiando o golpe está cobrando se vai ter o golpe. E o senhor responde: "Vai sim. Ponto de honra. Não está acabado ainda da nossa parte". Eu quero saber o seguinte: quem é o pessoal que colaborou? E colabou para o quê? Para o dia 8 de Janeiro?
"Angústia" do agro
Mauro Cid responde que Portela estava sendo pressionado por integrantes do agronegócio que estavam ajudando a manter as pessoas acampadas em frente aos quartéis e do Palácio da Alvorada. Segundo Cid, eles tinham expectativa pelo golpe de Estado.
— Ele (Portela) estava pressionado porque ele conhecia o pessoal de fora. Ele tinha contato com o pessoal do agro. E o pessoal do agro não viu nada acontecer. Eles achavam que ia acontecer alguma coisa. Eles estavam naquele "é hoje, hoje vai acontecer". Eles estavam nessa angústia de esperar que fosse dado o golpe. De esperar que o presidente assinasse um decreto e as Forças Armadas fizessem alguma coisa — diz Mauro Cid.
Horas de depoimentos foram colhidas e registradas em 2024 pela Polícia Federal (PF). Embora o sigilo da transcrição tenha sido derrubado na quarta-feira (19), as mídias ainda não estavam disponíveis para acesso público.
Na terça-feira (18), um dia antes da divulgação da transcrição, a Procuradoria-Geral da República (PGR) denunciou Bolsonaro e mais 33 pessoas por envolvimento na tentativa de golpe.