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Após três anos desvendando o submundo da política, a Lava-Jato colocou na alça de mira a maior autoridade da nação. Ao acatar pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), o Supremo Tribunal Federal (STF) passou a investigar o presidente Michel Temer por corrupção passiva, organização criminosa e obstrução à Justiça. Depois de afirmar com veemência na quinta-feira que não iria renunciar ao cargo, Temer passou a sexta-feira em reuniões de emergência no Palácio do Planalto. A divulgação da íntegra do inquérito nº 4.483 fragilizou a situação do presidente. Assessores e aliados já não descartam a capitulação.
Apesar da gravidade das acusações, Temer tentou construir cenário de normalidade institucional. Recebeu em seu gabinete o ministro da Defesa, Raul Jungmann, e os comandantes das Forças Armadas, além de ministros e aliados. Também telefonou para o governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão, anunciando a sanção do plano de recuperação fiscal dos Estados.
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Conforme exposto no inquérito aberto pelo STF, Temer agiu para frear a Lava-Jato, recebeu pelo menos R$ 30 milhões em propina e integra um núcleo político que promove "interações diversas com agentes econômicos, com o objetivo de obter vantagens ilícitas, por meio da prática de crimes, sobretudo corrupção". As acusações têm por base as delações de sete executivos do grupo JBS. Os depoimentos mais demolidores para Temer são os do ex-presidente da empresa Joesley Batista, que se apresentou voluntariamente aos procuradores e disse que ambos mantinham relação franca e frequente.
– Conheci o presidente Michel Temer tem cinco, seis anos, ele já como vice-presidente. Quem me apresentou ele foi o ex-ministro Wagner Rossi, nomeado dele. Ao longo desses anos, mantive relacionamento direto com ele, nunca teve intermediário, sempre ele ligava, eu ligava, ele mandava mensagem – descreveu Joesley.
Janot diz que há provas de uso de cargos para cometer ilícitos
O empresário detalhou o inventário da propina na relação com o presidente. Contou que aceitou pagar, a pedido de Temer, R$ 4,7 milhões entre 2010 e março de 2017. O acordo com o presidente incluía mesada de R$ 100 mil e repasse de R$ 300 mil, em espécie, ao marqueteiro do peemedebista, Elsinho Mouco.
Diretor da JBS, Ricardo Saud também entregou planilhas de pagamentos que seriam destinados a Temer, em um total de R$ 30 milhões. Os recursos seriam divididos entre peemedebistas. Há o relato de repasses de R$ 15 milhões e de R$ 9 milhões, além de R$ 2 milhões destinados à campanha de Paulo Skaf ao governo de São Paulo, em 2014. Outros R$ 3 milhões têm, segundo a JBS, Cunha como destinatário, enquanto outro R$ 1 milhão teria sido entregue em espécie a José Yunes, amigo de Temer.
Ao enquadrar Temer no crime de corrupção, o procurador-geral, Rodrigo Janot, diz que o presidente designou o deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), homem de sua "total confiança", para "interceder a favor do grupo J&F", holding controladora da JBS. Para descrever a ação da organização criminosa, Janot afirma haver provas de que "alguns políticos continuam a utilizar a estrutura partidária e o cargo para cometer crimes em prejuízo do Estado e da sociedade".
Na acusação de obstrução à Justiça, Janot escreve que o presidente, em articulação com o senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG), "tem buscado impedir que as investigações da Lava-Jato avancem, seja por meio de medidas legislativas, seja por meio da indicação de delegados de polícia que conduzirão os inquéritos".
Tentativa de mostrar clima de normalidade no palácio
A estratégia foi revelada por Aécio durante conversa com Joesley. O tucano cita no conluio ex-ministro da Justiça e atual ministro do STF Alexandre de Moraes. O plano, contudo, não teria sido consumado.
Janot indica ainda que Temer tinha interesse em manter sob controle o deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), condenado a 15 anos de cadeia e preso em Curitiba. No depoimento à PGR, Joesley afirma que o presidente compunha com Cunha o "esquema do PMDB na Câmara" .
Joesley diz que a orientação para manter Cunha e Funaro calados partiu do próprio Temer. Para Janot, o presidente deu anuência aos pagamentos. O empresário implica Temer também numa suposta proteção a Cunha no STF.
Um pouco antes, Joesley diz no depoimento que já havia revelado ao presidente ter enviado R$ 5 milhões a Cunha. O valor seria referente a um "saldo de propina" pela tramitação de uma lei de desoneração tributária ao setor de frango. O próprio Temer teria recebido R$ 15 milhões. Em outro depoimento, Saud disse ter repassado o dinheiro ao presidente em 2014, em retribuição à atuação favorável ao grupo.