Ninguém fala sobre a dificuldade de confiar em alguém depois de um relacionamento ruim. É um desafio, uma montanha-russa emocional. A gente faz terapia, muda o estilo de vida, corta o cabelo, promete que nunca mais cai na mesma cilada. Acredita que está renovada, que os traumas ficaram no passado. Mas a verdade? Eles seguem ali, espreitando.
Conhecer alguém novo, se abrir, tentar de novo, depois de tanta dor e decepção, é assustador. A gente se acostuma com a solidão, aprende a gostar dela. A vida solitária pode ser mais simples, mais segura. Mas a vida, essa danada, não quer só segurança. Quer coragem, como diria Guimarães Rosa.
E coragem, caríssimos, não é ausência de medo. É sentir o medo e ir mesmo assim. O salto no desconhecido parece um abismo sem fim. Mas pode ser um voo lindo também. Bom, pra mim foi. Tem sido.
Já vivi um amor que me fez duvidar de mim mesma. Que me ensinou a ter medo de palavras, de olhares, até de silêncios. Amor que não era amor, mas se disfarçava bem. Passei tempo demais me encaixando num espaço que não era meu. Depois, precisei de outro tanto pra me reencontrar, pra lembrar como era minha própria voz, meu jeito de rir, de existir sem pedir desculpas.
Dizem que depois do furacão vem a calmaria. O que não dizem é que, às vezes, a calmaria assusta mais do que a tempestade. O silêncio, depois de tanto barulho, parece estranho. O toque gentil faz a gente recuar. O cuidado sincero soa como pegadinha. E por um tempo, eu ri. De medo, de nervoso, de não saber lidar.
Até que um dia, sem grandes anúncios, eu percebi que estava amando de novo. Mas não daquele jeito desesperado, que sufoca, que cobra. Era um amor que me fazia respirar. Que olhava nos meus olhos sem fugir. Que escutava de verdade, sem pressa de responder. Que entendia minhas feridas e não tentava consertá-las, só respeitava.
Descobri que o amor de verdade não é grandioso como nos filmes. Ele mora nos detalhes. No café deixado na mesa de manhã. No “me avisa quando chegar” sincero. No braço que se estende pra dividir o peso da vida. No espaço dado sem cobrança. No riso leve no meio de um dia difícil.
Eu, que achei que nunca mais confiaria em ninguém, aprendi que confiança não é um presente, é construção. Um tijolinho por dia. Não com palavras bonitas ou promessas vazias, mas com presença, respeito, constância.
Ainda carrego cicatrizes. Algumas ardem de vez em quando. Mas hoje sei que elas não me definem. Sei que posso amar e ser amada sem deixar de ser eu. Aprendi que o amor não precisa ser um salto no abismo. Pode ser uma mão firme que segura a nossa quando o vento balança. Pode ser um pouso seguro. Pode ser simplesmente alguém que quer você inteira — do jeitinho que você é.