Gosto de eleger uma palavra para me servir como amparo nos dias em que me sinto órfão de esperança. Não é totalmente consciente: brota ao acaso, embora já esteja armazenada em um arquivo interno. Ultimamente tenho me abrigado neste vocábulo: lentidão. O fato de morar num lugar isolado, longe dos ruídos urbanos, tem me permitido escapar de determinadas armadilhas da modernidade. Mas os apelos para seguir caminho contrário são múltiplos e em vários momentos tentadores.
Mantenho-me fiel por ter desenvolvido certa aptidão em me centrar no que realmente importa. Evoco meus mestres e sou resgatado de um mundo nos incentivando à ligeireza e a tudo experimentar. Porém, a capacidade de travar conhecimentos verdadeiros é atravessada pelo desejo de me aprofundar nas experiências. Multiplicidade nunca foi sinônimo de excelência.
Aprecio o propósito de esgotar, aproveitando o que nos é oferecido. Objetos e pessoas costumam despertar interesse em mim por longo tempo. Apaixono-me com facilidade — no sentido de admirar, de querer. Mantenho fidelidade e só parto em busca do diverso depois de surgir algum movimento interior instigando-me a buscar o inédito. Normalmente isso demora bastante.
O vocábulo “ver” também tem adquirido força na minha imaginação. Para observar com clareza, precisamos parar e contemplar. Um exercício pouco praticado nesta época de velocidade estonteante. Desvio-me do propósito de simplesmente passar os olhos, ignorando detalhes. Parece mais enriquecedor devotar-me com cuidado, pois a realidade nos é apresentada em camadas, e muitas vezes a primeira impressão pode ser enganadora. Reaprender a seguir como o fluxo das estações, compondo um cenário de beleza para qualquer momento, na ordem de seus ciclos. E assim vou levando a vida, absorvendo com gosto o que me é entregue.
Vai aqui um lembrete perpassado pelo pensamento dos antigos filósofos gregos: todas as experiências são únicas, pois já não somos os mesmos no instante seguinte ao ocorrido. Faço uma prática mental, altamente benéfica: elejo um propósito e o isolo de seu entorno. A distração resulta da falta de foco, em diversas circunstâncias. E é deveras difícil mantê-lo. Por onde olhamos somos convidados à alienação. É como se letreiros luminosos aparecessem diante de nós numa sucessão infinita, clamando por atenção.
Enfim, podemos encontrar recursos para nos conduzir a uma existência saudável e produtiva. Não compactuo com a crença de estarmos à beira de um colapso. Este pequeno pedaço de história vivenciado por cada um traz desafios e benefícios. Basta ver o que aconteceu antes de nós e entender a existência de forma cíclica. É preciso encontrar nossas âncoras, deixando de lado a tentação de absorver só o ruim.
Estabeleça um ritmo interior que te traga serenidade. Ignore os apelos que te convocam à rapidez. Saboreie calmamente os frutos. Tais propósitos sustentam a nossa saúde mental e nos fazem andar devagar. Sempre devagar.