Quem me conhece sabe que, invariavelmente, me visto de modo muito colorido. Misturo cores que às vezes combinam, às vezes não, mas não me preocupo com isso. Gosto de misturar estampas, tecidos e cortes. No entanto, de quando em quando, volto para o preto. Às vezes porque me percebo acima do peso e o preto, diz a lenda, ajuda a disfarçar. Às vezes porque me deixo contagiar pelos tempos sombrios que vivemos. É difícil manter o colorido por fora se por dentro o tempo fecha e escurece. Não é nada fácil não sucumbir às raivas, intolerâncias e agressividades que enfrentamos, cotidianamente, sejam pelas mídias sociais, sejam nos almoços em família.
Dias atrás entrei no elevador e todas as pessoas estavam vestidas de cinza e preto. Sim, um tanto por conta do frio, outro pela elegância das cores sóbrias, mas também porque vamos nos deixando ficar mais opacos diante da vida e dos outros. Talvez a roupa revele em nós um aspecto camaleônico. Se ficarmos assim, mais cinzas e pretos poderemos disfarçar que estamos em cima do muro, de modo que, quase ninguém nos vê e teremos, então, uma chance de sobreviver. Os animais guardam imensa sabedoria. Por isso gosto das roupas coloridas e tenho simpatia pelas pessoas que ousam se colorir e sair para as ruas. Sou a favor da liberdade de expressão, pois somente assim temos espaço para criar e construir nossas identidades. Descobrirmos quem somos e quem são os outros. Sem medo, mesmo que o medo ronde nossos sonhos e desejos. Há espaço para todos. Para os que são monocolores e para os multicoloridos.
Precisamos nos conscientizar que somos lugares de vida, de semente, como diz Valter Hugo Mãe. Quando nos autorizamos a ser quem desejamos ser, abrimos espaço para que o outro se permita experimentar também. Somos seres de germinação, de tradução da vida, de cores e formas variadas, uns mais coloridos, outros menos. O que importa é que precisamos ser o contrário da violência, da crítica descabida, da intolerância, do preconceito, da punição e da morte. Talvez por isso eu me vista de colorido, quase sempre, por conta do meu compromisso interno com a vida, com a generosidade poética da aceitação de si e do outro, e da esperança que carrego, em acreditar nas pessoas. Talvez seja o momento de rever as roupas do armário, talvez sair do armário, talvez ousar ser quem se quer ser. Questionar as nossas certezas mais profundas, visitar as profundezas de nossa alma, estar em harmonia com nossas dores é também uma maneira possível de felicidade. Que nossas cores sejam tantas quanto o jardim de onde fomos expulsos, para que possamos juntos recriar um novo espaço de cor, amor, generosidade e possibilidade de vida nova.