Não há quem, em sã consciência, goste de pagar mais caro por combustíveis. Reajustes também têm impacto direto e indireto na inflação, em um momento em que o país consegue trazer o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) para patamares aceitáveis, de 3,99% em 12 meses, acima do centro da meta de 3,25% para 2023, mas dentro da margem de tolerância de 1,5 ponto percentual. O processo de desinflação dos últimos meses permitiu, inclusive, o início do tão esperado ciclo de corte do juro básico da economia.
A prática de segurar artificialmente preços de combustíveis abre espaço para distorções ainda mais danosas ao mercado
Apesar de ser um movimento impopular e de ter efeitos deletérios, deve-se dizer que foi ajuizada a decisão da Petrobras anunciada ontem de aumentar em R$ 0,41 o valor do litro da gasolina e em R$ 0,78 o do diesel nas refinarias. Os custos praticados pela estatal estavam bastante descolados das cotações internacionais. A prática de segurar artificialmente preços abre espaço para distorções ainda mais danosas ao mercado, além de afetar o caixa da empresa. Um desses riscos seria a disponibilidade interna de diesel abaixo da demanda. Nos últimos dias, aqui e ali surgiram informações, negadas pela Agência Nacional do Petróleo (ANP), de dificuldades na cadeia do setor para adquirir maiores volumes. Isso porque outros importadores, sem conseguir concorrer com os valores da Petrobras, paralisaram as importações.
Desde o ano passado, sabia-se que o governo Luiz Inácio Lula da Silva abandonaria a política de preço de paridade de importação (PPI), que acompanhava de forma mais rápida a oscilação das cotações do petróleo e do câmbio. Falou-se em “abrasileirar” os preços, sem uma explicação detalhada sobre como isso ocorreria. A nova gestão da empresa, no entanto, garantiu que não se descolaria completamente da referência internacional. Apenas amorteceria a volatilidade. Ocorre, no entanto, que tanto o petróleo quanto o dólar vêm em um movimento de valorização, enquanto a Petrobras resistia a fazer reajustes. Na segunda-feira, a defasagem em relação ao PPI chegava a 24% no diesel e 28% na gasolina, conforme a Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom).
Talvez a estatal estivesse segurando os reajustes pela repercussão no IPCA e para não afetar negativamente os índices de popularidade do governo. O passado, nas próprias gestões do PT, mostra que é uma estratégia desastrosa. Mais cedo ou mais tarde, é preciso realinhar os preços, causando impacto abrupto nas bombas e na inflação.
Essa artificialidade, deve-se lembrar, teve grande responsabilidade na deterioração da saúde financeira da Petrobras na década passada. Enquanto perdia receitas, era forçada pelo governo a entrar em projetos vultosos e duvidosos. Acabou como a petroleira mais endividada do mundo. O Planalto, agora, quer que a estatal seja protagonista nos investimentos do PAC. É contraditório, no entanto, fazer este movimento ao mesmo tempo que perde caixa. Apesar da demora, menos mal que o governo e a empresa se renderam aos fatos. Melhor seria também se a companhia fosse mais transparente em relação à metodologia de formação de preços.