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O grande segredo de ser segurança em um clube de futebol é estar de olho em tudo, mas passar despercebido. É parecer ausente, mas estar presente. Uma espécie de arte da discrição, dominada com maestria por Pedrão.
Nascido Pedro Roberto Carvalho Gonçalves, é conhecido pelo apelido no aumentativo para ajudar a impor respeito. Ninguém gostaria de ter um segurança chamado Pedrinho. Pois, Pedrão insere-se nessa estirpe de seguranças invisíveis, mas muitas vezes vistos. Por vezes se torna um papagaio de pirata involuntário.
Quando o atacante belga Francis Azumu chegou a Porto Alegre para assinar com o Grêmio, Pedrão estava no aeroporto de olho em cada detalhe. A proximidade na proteção ao novo contratado o fez onipresente nas fotos do desembarque.
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As manhas da profissão foram aprendidas com o tempo. Dos 72 anos de vida, 49 são como funcionário gremista. Desde 1976 a serviço das três cores, Pedrão aparece em terceiro lugar na lista dos funcionários mais antigos do clube. Somente o massagista Zezinho, contratado em 1973, e o Seu Vargas, da manutenção, contratado em 1971, estão há mais tempo.
Em um mundo supersticioso como o do futebol, estar no momento certo na hora certa faz a diferença. Um ano depois de chegar ao Olímpico, Pedrão foi transferido para o departamento de futebol. Naquele ano, o Grêmio encerrou a sequência de oito títulos estaduais do Inter.
— É como eles dizem, time que se ganha não se mexe. Eu estou aí, né? — ri.
Segurança não relaxa. Faz parte da profissão estar presente mesmo quando se está ausente. Sentado na sala de imprensa, Pedrão estava munido de um walkie talkie para acudir qualquer casualidade de última hora durante a conversa.
A aposentadoria não está em seus planos. A convivência com a turma do futebol faz bem para ele.
— É maravilhoso. Por exemplo, eu tô com 72 anos, mas não aparento, por quê? Porque eu trabalho com jovens, entra um jovem, sai outro. Eu tô sempre brincando com um, brincando com outro, conversando, e assim vai indo.
Entre histórias e segredos
Os anos de profissão o colocaram em poucas e boas. Mas Pedrão prefere lembrar as situações com resoluções na base das palavras, sem a necessidade de usar os punhos.
Nos tempos das vacas esquálidas no Olímpico, torcedores iam aos treinos para xingar os jogadores. Nesses momentos, ele desmontava os valentões sem levantar os braços ou a voz.
— Eu chegava lá, com calma, e dizia: “Meu amigo, não leva a mal. O pessoal tá trabalhando, tá tentando acertar. Vem domingo, no jogo. Se não gostar, pode vaiar, mas hoje eles tão tentando acertar. A fase não é boa. Daqui a pouco, um vai mandar o senhor longe. Aí, vão dizer que o jogador não tá preparado” — relembra.
Eu tô com 72 anos, mas não aparento, por quê? Porque eu trabalho com jovens, entra um jovem, sai outro. Eu tô sempre brincando com um, brincando com outro, conversando, e assim vai indo.
PEDRÃO
Segurança do Grêmio
A argumentação não foi muito bem recebida. O pretensioso interlocutor inflou o peito e soltou com a prepotência de quem não tem razão. Disse ser ele, torcedor, quem pagava o salário do segurança. Sem mudar o timbre, Pedrão emendou.
— Sim, senhor. O senhor paga o meu salário. Então, o senhor me faz um favor. Me dá um adiantamento de R$ 100. Quando o senhor pagar o meu salário, o senhor pode descontar. Os caras iam embora. Não aguentavam mais — diz, abrindo um sorriso.
A lógica de Pedrão mudou quando chegou ao Olímpico. Antes, trabalhava como segurança de madrugada. Em dia de Gre-Nal, de manhã, ao fim do expediente, ia para o Olímpico, ficava escondido em algum lugar desde cedo para conseguir entrar em campo sem pagar. O “Pedrão da época” não era tão eficiente.
— É uma satisfação. Foi sempre o meu sonho (trabalhar no Grêmio).
A turma que mais lhe deu trabalho vem fácil à cabeça. Ela não sai como confissão, mas como satisfação.
— Carlos Miguel, Paulo Nunes, Arilson, Alexandre Xoxó. Mas eles andavam naquele hotel lá, Continental (em Canela), voando. Mas dentro do campo resolviam. Foi um dos grandes times (o de 1995/96).
Seus olhos viram muito quando a porta do vestiário se fecha. Como bom segurança, segue a lei de “o que acontece no vestiário, fica no vestiário”.
— Nunca revelei os segredos nem para imprensa, nem para ninguém — assegura.
Está aí mais uma habilidade necessária para ser segurança. Proteger não apenas as pessoas, mas também guardar segredos. São quase 50 anos que Pedrão domina os dois ofícios.