O espetáculo Ana Cañas Canta Belchior, que está percorrendo o Brasil, desembarca em Porto Alegre nesta quinta-feira (24), no Teatro Bourbon Country (Av. Túlio de Rose, 80). Dirigido pela própria artista, o show contará com consagradas canções do músico cearense, como Alucinação, Velha Roupa Colorida, Sujeito de Sorte e Como Nossos Pais, em uma interpretação com linguagem própria da cantora paulista.
O projeto se iniciou durante a pandemia de covid-19, em uma live única, transmitida da sala de Ana, ainda em 2020, com objetivo de arrecadar fundos para a sua equipe e os músicos que a acompanham, uma vez que os shows estavam interrompidos. Porém, a ideia conquistou um grande número de admiradores. Dessa forma, o que seria apenas uma apresentação, transformou-se em um álbum, lançado no ano passado, e na atual turnê, ambos totalmente dedicados a Belchior.
Para Ana, que escolheu fazer o show por ser uma grande fã do compositor, foi uma agradável surpresa quando os fãs pediram que ela gravasse um disco — eles fizeram um financiamento coletivo para que a obra fosse produzida. Assim, aliou o seu amor pelo cancioneiro com a sua busca por aprendizado, como artista e ser humano.
— Belchior, para mim, significa o melhor do Brasil. Essa capacidade que os gênios têm de ir de uma ponta à outra, da erudição à "vida loka", trazendo elementos poéticos extremos sem perder a conexão com a simplicidade e, através dela, falar ao coração de qualquer pessoa — diz Ana Cañas.
A cantora e compositora paulista, nas 14 faixas que compõem o álbum, preza pela sutileza e, ao mesmo tempo, por interpretações densas e profundas. E não são apenas as músicas populares de Belchior que fazem parte do trabalho de Ana: ela também fez releituras de canções mais lado B do cearense, como Na Hora do Almoço e Galos, Noites e Quintais. Os arranjos produzidos pela própria artista e por Fabá Jimenez são minimalistas e buscam ser impactantes.
Legado
Toda a história deste projeto é especial, assim como o resultado do mesmo. Segundo ela, uma voz feminina relendo um clássico da música popular brasileira "é como um portal", como novos sentimentos e olhares. A artista explica que as mulheres têm um abismo singular, conhecem o cerceamento e a opressão de forma única e isso é traduzido no canto, com uma força peculiar.
A cantora, mesmo tendo a confiança de fazer versões próprias para a obra do compositor cearense, sabe que existe uma grande responsabilidade de cantar o legado de Belchior. Ela mesmo classifica esse desafio como "imenso", tanto pela sua importância quanto pelo amor que o público tem pela obra do artista:
— Cantar Belchior é, de longe, a coisa mais difícil que já fiz artisticamente. As letras são extensas e contam histórias não-lineares. É uma ode à palavra e eu, que sou da melodia, tive que encontrar um jeito novo de me entender musicalmente. Priorizar a dicção e, ao mesmo tempo, mergulhar nos sentimentos. Belchior exige isso. Não há superficialidade nenhuma em seu universo. É tudo muito intenso, catártico e visceral. Sua idiossincrasia é apaixonante. Fui tateando aos poucos, descobrindo e inventando ao mesmo tempo. Mas é um manancial tão infinito que continuo descobrindo camadas até hoje.
Ana acabou escolhendo, para o projeto, as suas músicas favoritas, mas reconhece que muitas ficaram de fora. A artista enfatiza que Belchior é um cancioneiro muito rico e que teria material para dois ou três discos.
— Escolhi as que conversam com as minhas próprias experiências de vida, as que contam histórias com as quais me identifico e que possibilitam a verdade na interpretação. Como mulher, é interessante perceber diferentes conotações em alguns versos. É uma visão diferente onde aprendo e cresço como ser humano — reforça.
Com a turnê, Ana explica que o reencontro com o público tem sido "emocionante", depois do período de confinamento devido à pandemia. Segundo ela, ver nos olhos dos fãs o sentimento quando interpreta cada canção de Belchior mostra que o artista "foi realmente além", com uma obra que atingiu "a metafísica das coisas":
- É muito emocionante porque quando vejo nos olhos do público o amor por essa obra, por essas canções, é que bate aquele sentimento: esse cara foi realmente além. É muito especial. Como compositora, penso que não há nada mais bonito do que transcender e deixar uma obra que atingiu a metafísica das coisas.
Sobre a apresentação em Porto Alegre nesta quinta-feira, ela diz:
— Estou muito feliz e ansiosa. Belchior tem uma história muito bonita com o Sul. Ele escolheu esse lugar para viver o seu período de autoexílio e tinha um carinho muito grande pelas pessoas daqui e vice-versa. Vai ser emocionante, vou chorar (para variar).
Os ingressos para o show de Ana Cañas variam de R$ 60 a R$ 180 e podem ser adquiridos pelo site da Uhuu.