
Após um show marcado por tantas emoções, Roberto Carlos finalmente ofereceu flores à plateia. O relógio marcava 23h07min desta quinta-feira (24) quando o Rei começou a distribuir rosas vermelhas e brancas às centenas de fãs ensandecidos na frente do palco do Auditório Araújo Vianna, em Porto Alegre.
Com ingressos esgotados e diante de 3,2 mil pessoas, Roberto realizou o segundo show consecutivo na capital gaúcha da turnê Eu Ofereço Flores. Antes, o cantor havia se apresentado na última quarta (23), em uma data extra, com dois terços do espaço ocupado. Agora, ele segue para Bento Gonçalves, onde subirá ao palco montado no Fundaparque (Pavilhão E), no sábado (26), a partir das 21h.
Aos 84 anos (completados no último sábado, 19), Roberto Carlos ainda mantém vigor suficiente para encantar plateias. Sua voz continua afiada o bastante para segurar um espetáculo. Embora se mova de forma mais lenta e contida, ele garante presença de palco, com exitosa interpretação e expressão corporal. Dá para sentir verdade no que Roberto procura transmitir nas canções apresentadas.
Há uma certa ternura de Roberto com o público. Ele é comunicativo (ao menos segue um roteiro razoável) e arranca risadas de seus fãs com brincadeiras.
Porém, às vezes, quando os fãs começam a gritar demasiadamente algum pedido ou a gracejar, ele não esconde sua perturbação. Aliás, nos últimos anos, ficaram notórios episódios em que Roberto perdeu a paciência.

Por exemplo, em um show no Rio de Janeiro, em 2022, ele falou “cala a boca” para umas pessoas barulhentas. No ano passado, em Recife (PE), o Rei se irritou com a imprensa aglomerada na frente do palco e ameaçou interromper o show.
De qualquer maneira, o cantor já assegurou em entrevista à Caras que leva esses momentos na esportiva. “A gente vai ficando um pouco menos tolerante. É a idade”, relatou à publicação.
No show de quarta, um grupo formado por uma dezenas de senhoras saiu correndo para a frente do palco, quando ainda restavam umas seis músicas para o fim. Feita a frente, parte do resto do Araújo aglomerou na frente do palco — tudo isso para garantir uma rosa do Rei. Ele transpareceu incômodo com o tumulto e os barulhos que se sucederam, mas o show seguiu normalmente.
Para o alívio de Roberto, a segunda apresentação em Porto Alegre não rendeu nenhum, digamos, incidente.
Nos dois dias, o público no Araújo era formado, majoritariamente, por fãs acima dos 50 anos. Boa parte cantava junto ou gritava “lindo”, “te amo”, “maravilhoso” ou até “gostoso”. Ou simplesmente se emocionava.
Repertório de sucessos
O show começou às 21h10min, com uma apresentação instrumental da competentíssima banda do Rei, conduzida pelo maestro Eduardo Lages. Neste momento, quem canta um trecho de Como é Grande o Meu Amor Por Você é o público.
Roberto entrou em cena cinco minutos depois e saudou a plateia:
— Queria dizer uma coisa para vocês, simples e importante: “Quando eu estou aqui e vivo esse momento lindo”...
Era a deixa para Emoções, que tradicionalmente dá boas-vindas aos fãs. Terminada a primeira música, ele refletiu sobre a passagem das décadas (“Sábado percebi que faz muito tempo”, referindo-se ao aniversário e sua carreira), mas também fez um alerta sobre o aguardado momento derradeiro do show:
— Muito cuidado na hora das rosas. Não venham antes! Não queiram incomodar os meninos e meninas que estão aqui na frente.
Dado o recado, a apresentação seguiu com Como Vai Você, Além do Horizonte (fazendo a plateia cantar “nananana”) e a dramática Desabafo.

Aliás, no trecho final de Desabafo, Roberto pausou a música após o verso “Mas sempre acabo em seus braços”:
— É mentira, cara! A verdade é quando elas querem.
Então, pediu para os homens presentes (35% da plateia, aproximadamente) cantarem o verso seguinte, “Na hora que você quiser”. O que foi obedecido.
O show teve sequência com as românticas Detalhes e Outra Vez. Antes da segunda, Roberto prestou tributo à compositora da faixa, Isolda Bourdot (1951 – 2018). Destacou que a autora escreveu a canção falando em um amor que ainda existia intensamente.
— Isolda tem toda razão. O verdadeiro amor existe sempre — afirmou. — Nesta plateia, alguém já viveu ou está vivendo um grande amor? Já que é assim, vamos terminar esta canção juntos — completou posteriormente.
Encerrado o romantismo, foi a vez de fazer o Araújo cantar o refrão devocional de Nossa Senhora. Além de amor e Nossa Senhora, Roberto também traz sua paixão por carros no repertório.
A banda fez uma introdução instrumental estendida para Calhambeque e O Cadillac, o que serviu como um intervalo para o cantor.
Outra paixão do Rei foi cantada em Lady Laura — música dedicada a sua mãe. Inclusive, ele destacou que a canção foi escrita com muita alegria, o que hoje não sente mais ao cantá-la. Ela morreu em 2010. Roberto, porém, salientou que o amor por sua mãe só aumentou com o tempo.
"Fase motel"
A “fase motel” de Roberto é contemplada no repertório. No período, que abrange a segunda metade dos 1970 e começo dos 1980, Roberto trazia em seus lançamentos algumas canções com alusões ao sexo. Um Rei com pimenta.
Na turnê, ele tem apresentado um pout pourri com as seguintes canções: Seu Corpo, Café da Manhã, Seus Botões, Falando Sério e Côncavo e Convexo.
Para introduzir esse momento, o cantor resgatou um texto “assanhado” escrito por Ronaldo Bôscoli e Luís Carlos Miele para aquele que ele considera seu primeiro grande show — realizado no Canecão, no Rio de Janeiro (RJ), em 1970.
No final dessa parte “motel”, ele induz a plateia a completar o final do verso “assim é nosso amor no sexo”. Mas o público não respondeu com a intensidade desejada. O Rei brincou:
— Tá fraco o sexo de vocês! Deixa que eu canto. “Assim é nosso amor… no sexo”.
Depois de Mulher de 40, em que o Rei decretou que “mulher não tem idade” (e a plateia vibrou), veio Cavalgada — outra da nuance motel.
Vale destacar aqui o tom épico que Cavalgada ganha aqui, com solos de guitarra e um instrumental puxado ao rock progressivo. Os músicos do Rei, aliás, foram apresentados com entusiasmo na sequência.
Quando foi a vez de Esse Cara Sou Eu, Roberto atestou que a música versa sobre um homem que toda mulher sonha e que ele gostaria de ser (“Ainda chego lá!”). Estava tudo calmo até aí. Só que na hora de Amigo, que veio a seguir, o publicou se empolgou.
O Araújo desceu em peso para a frente do palco. Foi uma correria, mas sem registro de acidentes. Um clima de festa de fim de ano tomou conta do espaço — quem não foi atrás da cobiçada rosa, passou a ficar em pé e a se soltar mais.
Como é Grande o Meu Amor Por Você deu uma acalmada nos ânimos com sua doçura, mas a plateia se animou novamente com Jesus Cristo.

Disputando flores
Por fim, Roberto encerrou o show com Eu Ofereço Flores, que batiza a turnê. Lançada em novembro de 2023, a composição é uma carta de amor aos fãs por todo o apoio e carinho ao longo de sua trajetória (“Eu quero agradecer/ Por tudo o que você/ De bom me faz sentir/ Por tantas emoções”).
Então, ao término da performance, Roberto faz aquilo que o título da música sugere. Foi o ápice para dezenas de contemplados. Cada rosa era disputada como se fosse um aviãozinho de dinheiro jogado pelo Silvio Santos no Topa Tudo Por Dinheiro.
Quem pegava a flor, comemorava como se tivesse conquistado um troféu — o que não deixava de ser. Havia quem pedisse duas, o que recebia a reprovação de Roberto. Aliás, o cantor não pareceu irritado ao entregar as flores, como viralizou em 2022.
Muitos gritaram, teve quem levou cartaz, havia empurra-empurra, mãos eram erguidas durante longos minutos, teve quem usasse o marido alto. Cada um com sua estratégia. Poderia ser um esporte olímpico.
A reportagem entrou na fila das rosas, mas saiu de mãos vazias. O fotógrafo teve melhor sorte ao obter uma pétala.
— Meu Deus, está doendo meu braço de tanto ficar erguido — queixou-se uma fã idosa na saída do Araújo.
— Alguém me empurrou e eu caí para trás. Cheguei a tocar na flor — lamentou outra fã da terceira idade. — Mas valeu, foram horas de música.
Para além das rosas, foi um show com muitos temas e emoções.