
A nova era de Vitor Kley começou. Seu novo e sexto disco, As Pequenas Grandes Coisas, chegou às plataformas digitais nesta sexta-feira (25).
Arquitetado entre São Paulo, Rio de Janeiro, Santa Catarina e Portugal, o disco marca a estreia de Vitor como produtor musical. Além dele, assinam também a produção Paul Ralphes, Giba Moojen, Marcelo Camelo e Felipe Vassão.
Com 11 faixas, o disco explora diferentes sonoridades – como pop rock, samba rock, bossa nova e pop oitentista –, sem deixar de conter aquela nuance ensolarada do músico. É um trabalho mais maduro do cantor, de 30 anos.
Chegou a hora de fazer um trabalho meu por inteiro. Vejo que esse é um álbum cada vez mais “eu”.
VITOR KLEY
Cantor e compositor
Por outro lado, é uma obra que chega após uma despedida recente de Vitor – o pai, Ivan Kley, morreu no dia 3 de abril.
Em entrevista a Zero Hora, o artista fala sobre como foi a produção de As Pequenas Grandes Coisas e a lembrança do pai presente no disco.
Confira a entrevista com Vitor Kley
As Pequenas Grandes Coisas foi produzido em quatro localidades diferentes – São Paulo, Rio de Janeiro, Santa Catarina e Portugal. Como foi esse processo de concepção?
Sempre quis gravar um álbum em diferentes lugares. Acho que As Pequenas Grandes Coisas foi o primeiro passo nesse sentido. Qualquer dia, quero gravar em locais ainda mais distantes uns dos outros (risos). Isso traz múltiplas experiências para as pessoas que estão ouvindo. Há diferentes sonoridades e vivências.
Acredito muito que um álbum vai além da música, é uma experiência completa. Quis muito trazer isso. Alinhar essa parte da logística foi um tantinho desafiador e complicado, mas deu tudo certo. Foi um processo muito bonito.
Nós já conversamos sobre o álbum A Bolha (2020) em duas ocasiões. Você mencionou que esse trabalho representava uma transformação na sua carreira, um momento em que teve mais liberdade para elaborar suas canções — um disco em que você “se vê”. E agora, o que você avançou com As Pequenas Grandes Coisas em relação ao álbum anterior? Qual é o sentimento agora?
Há duas palavras que resumem As Pequenas Grandes Coisas: coragem e certeza. A coragem de encerrar ciclos com A Bolha, de sair de uma gravadora da qual fazia parte há 10 anos e seguir de forma independente. E a certeza de ir atrás de nomes com os quais já tínhamos vontade de trabalhar, de chamar outros produtores, visitar novos lugares e também assinar a produção. Isso, por si só, já traz uma diferença enorme em relação a A Bolha.
E eu vejo que sai do roxo e entra num céu azul, viajando por novos horizontes. É um álbum mais leve e direto nos assuntos, em que tudo está ainda mais amarrado do que em A Bolha. Trago também o que aprendi lá atrás, mas com o “software atualizado” de agora, com a vivência de agora. E o tempo é muito precioso, né? São cinco anos desde A Bolha. O sentimento que bate aqui dentro é de evolução. A vida faz sentido quando a gente está em constante crescimento: não só profissional, mas também como ser humano.
A Bolha foi um trabalho marcado pela cor roxa. No que você procurou diferenciar esteticamente esta nova era da anterior?
Um passeio por esse céu. Estou me mudando para uma casa no interior. Muita gente nova, completamente diferente. Esteticamente, a cor mudou. Seguimos o caminho do arco-íris, depois do roxo, vem o azul. A gente começa a usar jeans, aqueles cheios de retalhos.
Esteticamente também evoluímos muito no sentido dos clipes, dos teasers, de todos os conteúdos. É um conceito todo amarrado, que carrega o que havia de melhor na essência.

A faixa de abertura Que Seja de Alegria tem aquela positividade e alto astral característicos da sua discografia. Porém, já vemos aqui algo diferenciado. Há uma batida que me remeteu ao samba rock. Essa música pode ser pensada como um cartão de visita de uma nova fase sua?
Totalmente. Ela abre o álbum justamente por isso. Traz algo, como tu definiu bem, meio samba rock – uma pegada que lembra Jorge Ben Jor e Tim Maia, mas, ao mesmo tempo, alguma coisa de Natiruts. E uma coisa minha também. Acho bonito juntar tudo isso numa música só. Quero muito explorar mais essa riqueza instrumental, com esses metais, essas dinâmicas que diminuem e depois voltam com força. E, obviamente, a mensagem está ali: ciclos se encerram, novos se abrem.
'Vai Por Mim' tem essa missão de ajudar quem está passando pelo que meu pai passou. É a música mais poderosa que já fiz na minha carreira
VITOR KLEY
Cantor e compositor
O samba Tudo de Bom (Ô Moça) conta com a mão de Marcelo Camelo. Como vocês se conheceram e como foi o trabalho com ele?
Foi demais, cara. Foi uma indicação do Paul Ralphes. Nossa, estou muito feliz com a amizade que foi criada. Ele somou muito com as características e o olhar dele para a música. O Paul fez essa ponte. Eu achava que ele não ia gostar do meu trabalho, mas, pelo contrário – curtiu muito. Quis fazer parte do time.
E, cara, quando me encontrei com o Marcelo, logo rolou uma conexão. Ele quis ouvir mais da minha obra, de tudo que eu tinha. E assim nasceu Tudo de Bom (Ô Moça). É muito a cara dele. Foi demais ter ido para Portugal gravar com ele, ter vivido dias com o Marcelo e sua família. É um grande amigo que a vida me deu.
Vai Por Mim é uma homenagem ao seu pai. Em que momento surgiu essa canção e, se ele a viu, como foi a reação?
Eu queria ter mostrado essa música para o meu pai quando ele estivesse bem. A depressão é uma doença traiçoeira. Às vezes, mostrar algo assim, vindo das nossas profundezas, pode ter um efeito contrário. Eu estava esperando meu pai melhorar. Infelizmente, não foi o que aconteceu. Então, a oportunidade que tive de mostrar para ele foi no velório. Foi uma coisa muito difícil para mim, para minha mãe, para o meu irmão.
Ao mesmo tempo, depois que a track (faixa) terminou de tocar, parece que recebi um sinal dele dizendo: “Aê, filhão! É isso aí! Vamos ajudar muita gente com essa música.” Vai Por Mim tem essa missão de ajudar quem está passando pelo que meu pai passou. Acho que vai curar muita gente. É a música mais poderosa que já fiz na minha carreira.
Aliás, no começo do mês, você se despediu do seu pai. Como é lançar um disco nesse contexto?
Olha, uma coisa que tenho certeza de que meu pai falaria para mim é: “A vida segue em frente, filhão, vai pra cima! Vamos por mais!”. Lembrei muito disso que ele dizia pra gente: que, independente do que acontecesse, era para seguir em frente. Esses dias, minha mãe mesmo comentou: “Teu pai ia falar exatamente isso”. Então, vamos em frente.
Sinto que agora esse álbum faz ainda mais sentido. Quero me dedicar e batalhar mais, porque sinto que As Pequenas Grandes Coisas carrega a energia do meu pai e do meu herói, Ivan Kley. Estou muito feliz de sentir a presença dele. Sinto ele comigo todo dia, converso com ele todo dia. Tenho certeza de que meu pai está abençoando esse disco — e a nossa vida.
Como surgiu a inclusão do Clóvis de Barros Filho em Vai Por Mim?
Quando fiz a pré-produção de Vai Por Mim, peguei uma entrevista do professor Clóvis e a inseri no fim. Era uma conversa com o Antônio Abujamra. O apresentador pergunta “O que é a vida?”, e ele respondia. Aquela pré-produção, feita anos atrás, ficou daquele jeito. E eu não conseguia mais ouvir a música sem o Clóvis falando.
Então, fui atrás do professor e conversei com ele. Na ocasião, ele ficou em silêncio. Depois de um tempo, respondeu: “Tô dentro, mas a gente tem que gravar isso de novo. Quero terminar pra cima, dando a vida pro teu pai”. Meu pai ainda estava naquela batalha na época, e a gente regravou.
“Nossa vida vale pela capacidade de amar e pela sorte de ser amado.” É lindo demais. Queria poder ter mostrado pro meu pai enquanto ele ainda estava aqui, que ele tivesse melhorado... mas são coisas que a gente entende depois, né? O porquê de tudo isso ter acontecido. Tenho certeza de que meu pai está abençoando e está muito orgulhoso e feliz com essa homenagem.
As Pequenas Grandes Coisas é um disco sem feat, com exceção da participação do Clóvis. O que influenciou essa decisão?
Sempre fui um cara conhecido por muitos feats. Foi incrível tudo isso – pontes foram criadas com pessoas que eu realmente amo –, mas chegou a hora de fazer um trabalho meu por inteiro. Vejo que esse é um álbum cada vez mais “eu”. Isso é muito bonito para as pessoas que gostam da minha arte, que estão de peito aberto para o meu trabalho.
