Os produtores rurais gaúchos fitam o horizonte na esperança de a chuva prometida para os próximos dias se confirmar e amenizar a escassez de umidade que ameaça mais uma safra de verão. A falta de precipitações adequadas já compromete as projeções de uma colheita cheia. A constatação preocupante está no levantamento da Rede Técnica de Cooperativas (RTC), que indica uma redução de 21% na produtividade da soja ante o esperado em outubro. A confirmação dessa quebra traz incertezas, inclusive, quanto ao crescimento esperado do PIB do Rio Grande do Sul para 2025.
O quadro atesta que o Estado segue despreparado para enfrentar o fenômeno recorrente das estiagens
Mesmo que as perdas diminuam caso a chuva volte, o quadro atesta que o Estado segue despreparado para enfrentar o fenômeno recorrente das estiagens. Políticas públicas parecem não ter o alcance idealizado. Nas propriedades, pelas mais variadas razões, inclusive alheias a suas vontades, como a disponibilidade de energia e burocracias, ainda se hesita em investir em irrigação.
A resiliência climática perseguida pelo Estado não deve se resumir à prevenção do impacto de enchentes devastadoras como as recentes. As estiagens são repetidas e legam prejuízos bilionários. Nos últimos quatro verões, foram três episódios. Levaram a uma perda equivalente a uma safra inteira, conforme cálculo da Federação da Agricultura do Estado (Farsul).
Ano após ano, as discussões se sucedem sem os resultados esperados. É intrigante a informação de que o programa do governo gaúcho para ampliar a irrigação está com dinheiro sobrando, à espera de tomadores. Só 10% dos recursos disponibilizados teriam sido empenhados. O Estado tem hoje somente 15% da área de milho irrigada. Na soja, cultura mais relevante economicamente, somente 3,2%.
É ilusão esperar que a maior parte das lavouras tenha essa alternativa no futuro. Ainda assim, há muito espaço para avançar, junto a outras frentes, como práticas conservacionistas que ajudem o terreno a reter umidade e pesquisas para desenvolver cultivares mais adaptadas. Nos últimos anos surgiram alguns avanços, como o fim da exigência de licenciamento ambiental para pivôs de irrigação. Outro exemplo é a possibilidade de açudes de até 25 hectares serem licenciados pelos municípios. Mas também existem casos que são verdadeiros monumentos à incúria, como as barragens de Jaguari e Taquarembó, na Campanha, obras iniciadas em 2009 e ainda inconclusas. É de se averiguar, ainda, se há margem para a utilização dos recursos dos fundos destinados à reconstrução do Estado após a enchente de maio para projetos que mitiguem os efeitos de períodos secos.
Por trás dos grandes números do PIB, estão centenas de milhares de famílias de agropecuaristas de todos os portes que, após uma sequência de safras frustradas e de um recuo nos preços das commodities, encontram-se endividadas e aflitas quanto à capacidade de honrar seus compromissos. A dificuldade se acentuará com uma nova colheita comprometida. O previdente é, no futuro, depender menos da chuva nos períodos em que mais se precisa dela. Irrigação, cumpre outra vez lembrar, não se resume a combater secas. É ferramenta que impulsiona a produtividade no campo.