
Só consegui ver dois filmes oscarizados até agora, o nosso Ainda Estou Aqui e Flow, a animação do gatinho preto que também provoca filas e histeria patriótica na Letônia. Em nenhum dos dois me diverti. Nem deveria, pois o filme brasileiro — premiado merecidamente por seu significado e pela atuação exuberante de Fernanda Torres — documenta um momento trágico deste país de carnavais intermináveis. Pesado, mas necessário, tanto para refrescar a memória dos mais antigos quanto para alertar os jovens sobre os danos irreparáveis do autoritarismo.
Mas o gato também me deixou angustiado. Gosto de gatos, fui para a tela grande pensando que daria pelo menos algumas risadas. Nada disso: o filme é sobre o dilúvio universal, um tema traumático para a gauchada, que ainda queima palha benta a cada chuvisqueiro. A água não para nunca de subir, passei o filme inteiro agarrado no saco de pipocas como se fosse uma boia salva-vidas.
Tudo bem, Flow tem os seus méritos. Em primeiro lugar, é uma alegoria da catástrofe climática que ameaça a humanidade. Aliás, não há humanos na animação. Passa a ideia de que todos já foram para o espaço, ou para outra dimensão, ou para o fundo do Planeta Água, que é no que se transforma a Terra. Os autores da história ressuscitaram a Arca de Noé, só que sem o comando do patriarca. Quase uma Revolução dos Bichos oceânica.
E aí, na interpretação deste cinéfilo bissexto, talvez esteja a outra grande mensagem do filme: a parceria entre os animais. Na hora do aperto, não há predadores nem polarização. Gato e cachorro são amigos desde pequenininhos. Mas nem essa saudável solidariedade animal alivia a aflição do espectador que acompanha a odisseia dos bichos. O filme termina e a água continua subindo.
Acho que o Ticiano Osório vai me matar se tomar conhecimento desta resenha um tanto ranzinza da animação premiada. Não vou questionar a escolha dos julgadores, jamais me atreveria. Mas tenho que ser sincero: preferia menos água e um pouco mais de distração. No filme Noé, que não ganhou Oscar em 2014, eu pelo menos me diverti quando a mulher do herói bíblico observou as cobras subindo na arca e exclamou assustada:
— Elas também?