
Colocar a educação de crianças e adolescentes no centro das políticas públicas passou a ser uma missão de vida do conselheiro Cezar Miola, do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul (TCE-RS). Ao encerrar na semana passada um ciclo de dois anos como presidente da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon), o conselheiro relatou iniciativas inéditas que levaram auditores de todo o país a ações de fiscalização nas escolas, além do envolvimento em programas permanentes para qualificação do ensino.
Considerada uma das principais ações de sua gestão, a Operação Educação mobilizou os 32 tribunais de Contas do país em uma auditoria conjunta que ao longo de três dias chegou a 1.088 escolas, em 537 cidades de todas as regiões. O levantamento mostrou, por exemplo, que 57% das salas de aula visitadas eram inadequadas, com problemas como janelas e móveis quebrados, além de iluminação e ventilação insuficientes.
Para ir além do papel de fiscalização, a entidade se envolveu na criação do Gabinete de Articulação para a Efetividade da Política da Educação no Brasil. O Gaepe-Brasil reúne atores do setor público e sociedade civil inseridos na política pública educacional. Desta forma, os auditores passaram a discutir os problemas diretamente com secretários de Educação de municípios e Estados, além de outras autoridades e especialistas na área.
Na cerimônia em que Miola entregou a presidência da Atricon ao conselheiro Edilson de Sousa Silva, de Rondônia, o legado de integração, a partir de ações conjuntas em outras áreas, foi exaltado pelo presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Bruno Dantas.
- A Atricon tem tradição de ótimos presidentes, mas eu preciso dizer aqui que poucas vezes vi um dirigente tão operoso como Cezar Miola. Um homem que merece cada aplauso desses e que foi incansável em um esforço de integrar todos os tribunais de Contas do Brasil – afirmou.
Na nova gestão, Miola atuará como vice-presidente de Relações Político-Institucionais. Em Brasília, o conselheiro conversou com a coluna sobre o período em que presidiu a entidade, além de detalhar o envolvimento dos tribunais de Contas nas políticas públicas de educação.
O senhor tem defendido um esforço federativo em defesa da educação infantil e da primeira infância. Qual foi o papel da Operação Educação dentro deste propósito?
Foi a primeira grande ação dos tribunais de Contas na educação de maneira unificada e em âmbito nacional. Todos se envolveram no projeto e fomos visitar as instalações físicas, ou seja, algo muito básico. Neste levantamento, encontramos muitas escolas onde os banheiros não tinham portas. Visitamos mais de mil escolas em um período de três dias. Primeiro, o objetivo era resolver a situação concreta, mas também chamar atenção para o problema e depois monitorar. Então, o nosso alerta aos tribunais é de que não basta levantar o problema, precisamos verificar se isso foi resolvido.
Também é possível avançar para que as auditorias avaliem aspectos qualitativos do ensino?
Hoje, temos acesso a um banco de dados muito rico, que possibilita a análise, por exemplo, de desempenho. Precisamos ir além de conferir se o município ou o Estado aplicou o mínimo constitucional da educação. Qual o resultado disso? Quais as entregas à população? Diminuiu a taxa de analfabetismo? As crianças estão aprendendo a ler e escrever na idade certa? Tem transporte escolar seguro e alimentação balanceada? Essa é uma análise qualitativa que temos tentado fazer cada vez mais e, ao trazer à tona esses problemas, alertar o gestor e atuar preventivamente.
Muitos prefeitos se queixam de que os tribunais de Contas agem apenas para punir. Como é este trabalho preventivo?
O gestor de boa-fé tem no controle um aliado. Não interessa ao Tribunal de Contas a aplicação da sanção por si mesma, ela tem de ocorrer por uma situação que não pode ser evitada e que se configurou um ato lesivo, uma irregularidade grave. Por isso, cada vez mais atuamos na qualificação dos gestores, oferecendo cursos e assistência para evitar os problemas na origem. Acredito que estamos criando uma relação de confiança entre o controle e os gestores.
O senhor tem mais de 40 anos de trajetória no serviço público e sempre destacou a educação como prioridade. Os gestores públicos também a colocam neste patamar?
A própria Constituição coloca no artigo 227 só a educação como absoluta prioridade. Então, às vezes o camarada diz que faltam recursos, mas ele contrata um artista famoso e paga R$ 500 mil para alguém cantar em praça pública. Discricionariedade só existe quando você cumpriu todas as exigências legais. Aí não tem vaga em creche. Como fica? Então, posso afirmar que hoje há um esforço dos tribunais de Contas para ajudar na concretização dos direitos fundamentais, não somente na educação, mas também na saúde, segurança, nos direitos fundamentais.