
O Rio Grande do Sul é mencionado em trechos da denúncia feita pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outras 33 pessoas, por tentativa de golpe de Estado. A investigação aponta que um grupo de policiais federais e rodoviários federais teria planejado interferir no segundo turno para diminuir a votação de Luiz Inácio Lula da Silva em algumas das principais cidades gaúchas, onde o petista tinha sido vitorioso na primeira rodada. A ação consistiria em bloqueios de estradas e vistorias em veículos, para atrapalhar o fluxo de eleitores.
As cidades que seriam alvo dessa ação no Rio Grande do Sul são Pelotas e Porto Alegre, segundo a investigação. A PGR trabalha com a informação de que, em 30 de outubro de 2022, data do segundo turno da eleição presidencial, mais de dois mil ônibus foram parados em bloqueios da PRF. Sobretudo no Nordeste, região que concentrava maior vantagem eleitoral para o candidato Lula. Conforme um levantamento do sistema interno da PRF que mostra as primeiras 549 vistorias, elas se distribuíram da seguinte forma pelo país:
- 272 operações no Nordeste (49,5% do total).
- 122 no Centro-Oeste (22,22%).
- 59 no Norte (10,7%).
- 48 no Sudeste (8,74%).
- 48 no Sul (8,74%).
Conforme a PGR, o planejamento dessas ações foi feito por integrantes do Ministério da Justiça, fiéis a Bolsonaro. Entre eles, o delegado de Polícia Federal Fernando de Souza de Oliveira, à época diretor de Operações do Ministério da Justiça e Segurança Pública (e que viria a ser secretário de Segurança Pública do Distrito Federal por um breve período). Outra é a ex-diretora de inteligência do Ministério da Justiça Marília Ferreira de Alencar. E, também, o ex-diretor-geral da PRF Silvinei Vasques, que chegou a ser preso por envolvimento nos bloqueios.
Trecho da denúncia da PGR menciona que após o primeiro turno das eleições de 2022, a delegada Marília solicitou a elaboração de um projeto de Business Intelligence (BI) voltado aos resultados eleitorais. O objetivo era coletar informações sobre os locais onde Lula havia obtido uma votação expressiva e onde Bolsonaro havia sido derrotado, com foco especial nos municípios da Região Nordeste. "A ferramenta figurava como elemento crucial na execução do plano de manutenção de Jair Bolsonaro no poder, uma vez que visava reverter o favoritismo do oponente, percebido, tanto pelos resultados do primeiro turno quanto pelas pesquisas de intenção de voto no segundo turno", salienta a PGR.
O histórico de conversas de Marília com o delegado federal Fernando de Souza de Oliveira mostra que a ideia era direcionar as ações de fiscalização da PRF no segundo turno, que se concentraram em locais onde Lula havia recebido mais de 75% dos votos.
A perícia no aparelho celular de Fernando Oliveira ele e Marília integravam um grupo de WhatsApp intitulado "Em Off", voltado a apoiar Bolsonaro. Em outubro de 2022, Marília enviou mensagem no grupo, afirmando que em "Belford Roxo (RJ) o prefeito é vermelho, precisa reforçar PF". E acrescenta: "menos 25.000 votos. Em seguida, Marília perguntou a Fernando qual seria o próximo passo sobre os relatórios. Recebeu a resposta: '52 x 48, são 5 milhões de votos para virar', em referência à diferença entre os candidatos no resultado das eleições", ressalta a PGR.
Outra mensagem de Marília no grupo Em Off, em 16 de outubro de 2022, ressalta: "Pelotas foi 52x 36 pro Lula"..."202 mil habitantes", "cara, os caras tem que rodar essas bases", "Poa (Porto Alegre) também, foda, 49x39 pro Lula". Fernando respondeu: "Manda, o RS tem muito eleitor PT".
O "manda", segundo interpretação da PGR, era mandar a PRF dificultar o trânsito de eleitores nessas cidades. Ao que tudo indica, as vistorias ocorridas no Rio Grande do Sul não chegaram a atrapalhar a normalidade da eleição.
Marília, Fernando e Silvinei Vasques não tinham sido indiciados pela Polícia Federal, porque a quebra de sigilo dos telefones ficou pronta após a investigação. Mas foram denunciados agora por organização criminosa, tentativa de golpe de Estado e atentar contra o Estado Democrático de Direito. O colunista não conseguiu contato com a defesa desses investigados. O espaço segue aberto para manifestação.