
A sessão de quarta-feira (9) no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados foi, mais uma vez, um espetáculo. Não no sentido nobre, mas como encenação disforme, onde a ética veste a fantasia do oportunismo e o enredo já vem pronto, antes do primeiro grito no plenário. O órgão decidiu cassar Glauber Braga (PSOL-RJ). Foi cassado por perder o controle diante de um provocador profissional — um daqueles personagens meio caricatos do submundo da política digital, que apontam o celular como arma e pescam a histeria como se fosse troféu.
Glauber caiu na armadilha. Reagiu com o corpo, não com a cabeça. Partiu para os empurrões, chutes e socos. E aí, pronto: a cena que interessava já estava capturada. A provocação deu certo. O adversário mordeu a isca e o resto virou processo. O Conselho de Ética fez seu papel, decidiu pela cassação. Do ponto de vista técnico, é difícil defender Glauber. Mas o problema está menos no veredito e mais no tribunal.
Porque o Conselho de Ética — que carrega no nome uma virtude — virou palco de conveniência. A bússola moral ali dentro gira de acordo com o vento político. O que é inaceitável para um, vira nota de rodapé para outro. Glauber cometeu um erro e pagou por ele. Mas Carla Zambelli, que saiu armada pelas ruas de São Paulo atrás de um cidadão, segue no cargo. André Janones admitiu para a Justiça que praticou rachadinha — e nada aconteceu. Eduardo Bolsonaro e Jean Wyllys trocaram cusparadas em plenário e também foram poupados. O que faz um ser punido e o outro blindado? A resposta é óbvia: rabo preso.
Glauber pagou pelo que fez — mas também pelo que representa. Foi cassado por não ter os aliados certos. Por não estar do lado mais útil naquele momento. A ética, nesse cenário, não é um princípio, é uma ferramenta. É usada para punir os desafetos e proteger os parceiros de quem manda no colegiado. Serve, portanto, não à moral pública, mas à estabilidade das relações internas do poder.
A política brasileira se acostumou com a impunidade disfarçada de critério. O cidadão que acompanha os desdobramentos entre um vídeo e outro no Instagram, entre um escândalo e outro no TikTok, já perdeu a capacidade de se indignar. E quando não se indigna, se resigna. Quando aceita, normaliza. E aí, o que resta é isso: um parlamento que tolera a violência, desde que seja de quem convém. Um Conselho de Ética que julga com base em planilhas eleitorais. E um país onde o erro não é ser antiético — é ser mal relacionado.
Essa crônica não é sobre Glauber. É sobre todos os outros que não caíram. E sobre um sistema que faz da ética um adereço que se usa ou se tira, conforme o figurino da ocasião.