Uma cidade tem o tamanho de quem a sonha. Nos últimos 58 anos, desde que Dona Eva e o marido adotaram Porto Alegre, em 1960, a cidade foi do tamanho da sua ambição, que não era pouca, e dos seus sonhos, que não eram pequenos. Nos sonhos de Dona Eva, Porto Alegre era uma metrópole cultural, uma capital orgulhosa do passado e confiante no futuro que não apenas merecia, mas precisava de um complexo cultural da dimensão do Multipalco - um projeto tão grandioso que, para muita gente, era maior do que a cidade.
Para colocar esse sonho em pé, Dona Eva mobilizou toda sua energia e reputação, dentro e fora do Rio Grande do Sul, da mesma forma que havia feito, anos antes, quando devolveu um Theatro São Pedro ameaçado de demolição para Porto Alegre - não como uma casa de espetáculos qualquer, mas como a joia da qual todos os gaúchos, até os que nunca pisaram lá, se orgulham. Bateu em todas as portas, tomou cafezinho com empresários e políticos, cooptou artistas e jornalistas para a causa, mobilizou o público, gastou saliva e sola de sapato. Sonhou grande porque não sabia fazer diferente. E nós sonhamos com ela.
Nos últimos anos, ao contrário da ambição de Dona Eva, Porto Alegre e o Rio Grande do Sul pareciam estar encolhendo. A crise piorou um cenário de captação que já era ruim, e a cultura não apenas foi minguando por aqui, como, no caso do cancelamento abrupto e burro da exposição Queermuseu, no ano passado, deu um vergonhoso salto para trás. A mediocridade parecia estar vencendo a imaginação, e a cidade ficou pequena para Dona Eva.
Mesmo assim, o Multipalco foi ganhando forma, pouco a pouco, e hoje está quase pronto. Fruto não apenas da obstinação de Dona Eva, mas da sua capacidade para motivar e envolver as pessoas em seus projetos.
Porto Alegre queria lhe dar esse presente, Dona Eva. Queríamos vê-la, no dia da inauguração do Multipalco, celebrando mais uma conquista e talvez já anunciando um novo projeto grandioso e aparentemente impossível. Porto Alegre agora tem dois compromissos a cumprir: colocar o Multipalco para funcionar a todo vapor e voltar a ser tão grande quanto os sonhos que a senhora sonhou para nós.