
Milhões foram gastos em produção, badalação e antecipação, mas os resultados de Vale Tudo, em termos de audiência, ainda são modestos. Em comparação com o desastre épico que veio antes, o remake da trama de Gilberto Braga não conseguiu conquistar muitos espectadores além daqueles que assistem a qualquer tranqueira que passa depois do Jornal Nacional. Mas se o grande plano secreto da emissora era fazer eu voltar a assistir uma novela, pode-se dizer que a estreia foi um sucesso incontestável.
(No tempo em que eu assistia novelas, o único aparelho digital da minha casa era um rádio-relógio AM/FM. Estamos falando do século 20, esse já distante planeta onde alguns de nós nasceram, cresceram e criaram memórias para abastecer o horário nobre da vida. Nunca foi um paraíso, mas visto assim, de longe, o século passado ganha novos encantos a cada dia que passa.)
O grande acerto do remake, pelo que se viu até agora, é atender à nostalgia dos noveleiros de outrora sem que o caldo pareça apenas requentado ou artificialmente temperado com novidades. O segredo não está apenas na boa combinação do novo com o antigo, como se vê na abertura, recriada a partir da original, ou na trilha sonora, que reúne artistas de diferentes gerações — com destaque para a inspirada interpretação de Gente, de Caetano Veloso, por Xande de Pilares. Quem está de volta, depois de longa ausência, são os atores de verdade, os diálogos interessantes e o encadeamento coerente da ação nos núcleos principais e secundários. Tudo que ajudou a telenovela brasileira a tornar-se uma paixão nacional — até a internet, os streamings e as séries mudarem radicalmente os hábitos de consumo de teledramaturgia.
Vale Tudo 1 (1988) estreou no momento em que o Brasil se preparava para eleger o primeiro presidente de sua recém-restaurada democracia. Dançávamos ao som de Brasil e Que país é este sabendo que nada era como devia ou podia ser, mas o futuro não parecia um lugar tão assustador assim para se viver. Vale Tudo 2 chega em um momento de intranquilidade global e divisão interna. Cazuza e Renato Russo estão mortos, e as perguntas que eles fizeram continuam sem resposta. Que bom imaginar que o Brasil poderia voltar a ser um só, pelo menos durante alguns minutos, enquanto todos torcemos para que vilões sem caráter sejam punidos exemplarmente no final.