O escritor israelense Yuval Noah Harari diz, no seu livro Sapiens, Uma Breve História da Humanidade, que a grande revolução do Homo sapiens foi sua capacidade de criar realidades compartilhadas, como religiões, sistemas políticos e códigos morais. Foram essas abstrações que permitiram a coesão social e a construção de civilizações. No entanto, o mesmo mecanismo que uniu pessoas em sociedades também foi usado para justificar barbáries ao longo da história. Guerras, genocídios e atos individuais de violência extrema são contradições, mas também parte desse desenvolvimento ao longo dos séculos.
Temos visto uma série de acontecimentos que devem nos fazer refletir sobre a humanidade e seu rumo. Uma sociedade que não fica indignada com brutalidades, é uma instituição que faliu moralmente e como parte de uma civilização. Nessa semana o Rio Grande do Sul assistiu, atônito, a um homem que se diz pai e que jogou o filho vivo de uma ponte para atingir a ex-mulher. Assistiu também a um funcionário que colocou soda cáustica no bebedouro da empresa para fazer mal aos colegas. Como se não bastasse, em outro caso, o chefe torturou o empregado por mais de oito horas. Não precisei nem usar a memória, são todos casos desses últimos dias.
A crueldade humana, ainda que apareça em casos específicos, é assustadora. Na história se descreve o humano como um ser capaz de ter empatia e raciocinar, mas que também pode cometer atos brutais como esses. A sociedade, desde sempre, precisa ser analisada sob vários aspectos, como transtornos mentais, repetição de padrões e ciclos de violência que não são quebrados. Além disso, ocorre o prevalecimento dos mais fortes em relação aos mais vulneráveis. Ouvia no Timeline, da Gaúcha, o psicólogo e psicanalista Julio Walz. Em uma analogia bem simples, ele dizia que o homem que atirou a criança de cinco anos da ponte não atacaria um cachorro feroz. Simplesmente porque seria atacado de volta, e com mais força. É por isso que a criança, frágil e pequena, vira presa fácil de criaturas como essa. Criança precisa ser defendida. Quem tinha que fazer isso neste caso fez exatamente o contrário, e de forma covarde e monstruosa.
Tentando entender o que acontece nesses casos, também ouvimos na Gaúcha a promotora de Justiça do Ministério Público do Rio Grande do Norte, Érica Canuto, especialista em relações familiares. Ela chamou atenção para o quanto a saúde mental é subestimada e até causa de vergonha. Prestar atenção no seu comportamento e no do outro é imprescindível para evitar novos crimes. Doença mental não tratada é bomba-relógio e pode explodir a qualquer momento.
Diante desse cenário, o desafio da civilização é fortalecer as bases familiares, éticas, de sanidade. Educação emocional, suporte psicológico e políticas públicas eficazes são fundamentais para acertarmos os ponteiros.