
Na juventude construímos o nosso futuro. É quando nos testam, nos tentam, apresentam opções boas e ruins. É o momento de criar consciência, entender os caminhos e começar a formar opinião sobre temas importantes. É o período em que achamos que sabemos tudo, mesmo com pouca experiência, o que nos torna arrogantes. Estamos vulneráveis.
É assim também para a jovem democracia brasileira. Antes dela, esse espaço do jornal talvez tivesse uma receita de bolo ou uma música com mensagens cifradas. Nesse tempo, o da ditadura, o Brasil se acostumou a ver exemplos de pessoas exiladas. Quem precisou sair do seu país de origem para escapar de um regime autoritário, tentando manter a liberdade e até a integridade física. De 1964 a 1985, muita gente fugiu para evitar perseguições políticas, prisões arbitrárias e até a morte. Não havia certeza e nem escolha.
Agora, porém, há o fenômeno dos exilados por opção própria. Cito os dois exemplos famosos do Brasil, em extremos do espectro político. O então deputado Jean Wyllys, em 2019, renunciou ao mandato e foi morar na Europa, justificando sua saída pelo aumento das ameaças que recebia, especialmente após a ascensão de Jair Bolsonaro ao poder. Foi duramente criticado pelo clã do ex-presidente.
Chegou a vez de Eduardo Bolsonaro, que recentemente anunciou a mudança definitiva para os Estados Unidos, alegando perseguição do Supremo Tribunal Federal e insegurança diante do avanço de investigações contra apoiadores do pai. Ele sequer é indiciado no inquérito do golpe, mas se sentiu ameaçado e levou a família embora. Seguindo o exemplo de Jair quando perdeu a eleição, resolveu fugir para o país de Donald Trump.
Embora queiram parecer exilados ou vítimas de um sistema ou instituição, tanto Jean como Eduardo têm tranquilidade para ir e vir, viajar, ter seus luxos no exterior e aqui. A liberdade que eles querem, eles têm, aqui ou lá. Trata-se de escolha voluntária, não de sobrevivência, é preciso ressaltar. Essa diferença só reforça a importância da democracia. No Brasil de hoje, políticos que se dizem perseguidos podem expressar suas opiniões, buscar apoio e voltar para casa quando quiserem. Têm seus muros e seus seguranças.
A democracia nos deixa suscetíveis às críticas, ao elogio, às diferenças, convivendo e assegurando o direito de defesa e o devido processo legal. Diferente de tempos sombrios do passado, ninguém precisa mais fugir para salvar a própria vida. Isso, por si só, já demonstra que avançamos nesses 40 anos de redemocratização comemorados há pouco. Se há algo a aprender com esses episódios, é que a democracia não pode ser relativizada. Ela não vale somente quando concordamos com quem ganha uma eleição.