
O Ministério Público (MP) deverá reexaminar o caso do paciente que recebeu uma superdosagem de medicamento no Hospital Humaniza, em Porto Alegre. Internado em estado vegetativo desde outubro de 2021, Alexandre Moraes de Lara, 31 anos, morreu no domingo (27).
Uma médica e duas auxiliares de enfermagem respondem a um processo judicial por lesão corporal culposa. No entanto, com a morte de Alexandre, o tipo de crime pode se alterar.
Segundo o MP, a médica e as duas auxiliares de enfermagem, que teriam sido responsáveis por realizar o cadastro dos medicamentos no sistema do hospital, foram denunciadas em 9 de julho do ano passado.
O crime de lesão corporal culposa pode ter aumento de pena, em caso de condenação, por inobservância de regra técnica de profissão. Ou seja, pelo fato de possuírem conhecimentos técnicos e práticos, mas não observarem no momento de agir.
Audiência para discutir acordo é cancelada
De acordo com o promotor de Justiça Luís Alberto Bortolacci Geyer, de Porto Alegre, como se tratava de um caso de lesão corporal culposa, por erro técnico, cabia a suspensão condicional do processo.
Nesse caso, poderia ser firmado um acordo com as denunciadas — o MP oferece um benefício, no qual o acusado cumpre condições fixadas pela Justiça, e a punibilidade é extinta. Uma audiência para dar andamento ao caso estava marcada para agosto.
No entanto, com a morte de Alexandre, o promotor pediu à Justiça que essa audiência fosse cancelada e que ele pudesse reexaminar o caso, com intuito de concluir se o tipo de crime pelo qual as três respondem deve ou não ser alterado. Se necessário, o MP pode fazer um aditamento da denúncia, complemento que pode ser realizado caso surjam fatos novos no processo.
Segundo o Judiciário, "uma vez noticiado o falecimento de Alexandre Moraes de Lara, o Ministério Público pediu a realização de diligências no processo. Após a juntada da documentação requisitada pelo Juízo, o processo seguirá com vista ao Ministério Público para análise de eventual aditamento à denúncia".

Relembre o caso
Em 2021, Alexandre recebeu uma superdosagem de medicamento quando procurou atendimento no Hospital Humaniza, em razão de uma arritmia cardíaca. Desde então, estava em estado vegetativo. Segundo familiares, nos últimos dias, o paciente apresentava dificuldade respiratória e baixa saturação.
— Ele sofreu a maior parte do tempo. Era um sofrimento para ele viver em cima da cama. Ele não tinha vida, só sobrevivia — descreveu a esposa, Gabrielle Bressiani, 30 anos, que estava grávida de três meses quando aconteceu o caso da superdosagem. A filha do casal, Sara, hoje tem três anos.
Conforme a família, no consultório, o cardiologista prescreveu corretamente a dosagem de 600 miligramas de propafenona, um medicamento destinado ao tratamento das alterações do ritmo cardíaco. Contudo, no pronto atendimento, recebeu dose 10 vezes maior, de 6 mil miligramas — em vez de dois comprimidos, foram dados 20.
A superdosagem resultou em uma intoxicação medicamentosa que levou o paciente a convulsões e uma parada cardiorrespiratória, deixando Alexandre com uma lesão cerebral permanente e irreversível. Ele nunca mais deixou o hospital.
Investigação policial
Em janeiro de 2023, a médica Erika Bastos Schluter foi indiciada pela Polícia Civil pela lesão corporal. Ela era a responsável pelo atendimento no momento em que foram administrados os comprimidos. A conclusão é de que ocorreu uma ação culposa, sem intenção. A médica foi afastada do Hospital Humaniza logo após o caso.
O advogado de defesa de Érika, Flávio de Lia Pires, disse não concordar com o resultado das investigações e que a cliente foi induzida ao erro.
— Independentemente da consequência, lamentável sem dúvida, a médica não teve nenhuma responsabilidade sobre o fato, que recai toda sobre a farmácia do hospital ou sobre o próprio hospital se não houver um farmacêutico responsável. Ao médico cabe receitar a dosagem e esta foi determinada de forma correta — afirma o defensor.
A reportagem entrou em contato com o Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Sul (Cremers) sobre a situação da médica atualmente e aguarda retorno.
Já as duas auxiliares de enfermagem — que não tiveram os nomes divulgados — foram denunciadas pelo MP em julho do ano passado.
Hospital processado
Segundo a esposa de Alexandre, a família processou o hospital na Justiça, mas ainda não recebeu nenhuma indenização. O caso foi registrado no perfil do Instagram @justicaporalexandre, que tem 120 mil seguidores.
O que diz a instituição
Sobre o episódio, Hospital Humaniza enviou a seguinte nota para Zero Hora:
"O hospital lamenta, com profundo pesar, o falecimento do paciente. Solidariza-se com seus familiares e amigos neste momento de dor e coloca-se à disposição para prestar o apoio necessário."