Uma campanha chamada Janeiro Seco estimula a passar o primeiro mês do ano sem ingerir uma gota de álcool. É uma forma de desintoxicar o corpo dos excessos cometidos durante as festas de dezembro e começar o novo ciclo adotando uma rotina mais saudável.
Desde que a pessoa não seja dependente, o movimento é benéfico para a saúde, dizem especialistas. No caso de um alcoolista, a abstinência precisa ser feita com tratamento e acompanhamento.
Atuante no Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (CAPS AD III Passo a Passo), em Porto Alegre, o psiquiatra Vauto Alves Mendes Filho diz que qualquer período sem ingestão de bebidas alcóolicas vai apresentar melhoras para a saúde física e mental:
— Vejo muitos benefícios. Ficar um período sem ingerir álcool pode melhorar a qualidade de sono, o fígado será poupado, a hipertensão é regulada, e ainda contribui na perda de peso. Para a saúde mental, mais benefícios: se a pessoa tem depressão ou ansiedade, esses sintomas são amenizados.
A privação também é uma forma de aprender a socializar de cara limpa, observa o psiquiatra Flávio Pechansky, professor de Psiquiatria na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e do Serviço de Psiquiatria de Adições e Forense do Hospital de Clínicas de Porto Alegre.
— Esse movimento pode ter um efeito interessante de incentivar as pessoas a fazerem coisas sem a necessidade de beber álcool, como ir a um encontro e ter uma conversa bebendo água. Como será essa conversa? Nesse aspecto, é um movimento que incentiva a sair da zona de conforto, principalmente os jovens, que têm mais dificuldade social. E um janeiro seco com redução no consumo de álcool sem dúvida afetaria positivamente os índices de ocorrências no trânsito — acrescenta Pechansky, que também é presidente do Conselho Internacional de Álcool, Drogas e Segurança no Trânsito.
Como aderir
Se a proposta é ficar um mês inteiro sem beber, é importante garantir mudanças na rotina para que o desafio seja atingido com sucesso. A principal é investir em exercícios físicos e alimentação saudável, diz Mendes Filho.
— O ideal é que a pessoa adquira hábitos saudáveis e aproveite o momento para engajar em uma atividade física, manter uma alimentação saudável, fazer alongamentos, meditação. E quando falamos em atividade física, pode ser algo simples mesmo, como uma caminhada, que é gratuita e tem benefício importante.
Segundo o psiquiatra, quem não tem problemas de dependência não deve sentir efeitos físicos de abstinência, como tremores nas mãos. No máximo, sofrerá alguma pressão de amigos e familiares para beber, a qual terá que resistir.
— Como o álcool é uma substância muito aceita na sociedade, talvez essa pessoa sofra alguma pressão para ingerir algo, algum constrangimento por não estar bebendo. Isso acontece em nossa sociedade: as pessoas constrangem umas às outras para beberem — alerta.
Para quem tem o hábito de tomar uma taça de vinho ou uma cervejinha enquanto realiza alguma atividade dentro de casa, como cozinhar, vale investir em substitutos que agradem o paladar, como um suco ou uma água com gás.
Alertas
Importante frisar que nenhuma quantidade de álcool é segura para a saúde. E o Janeiro Seco não é recomendado a alcoolistas. Sem tratamento e acompanhamento adequados, essas pessoas costumam retornar de períodos de abstinência com uma dependência mais acentuada.
— Para o restante, essa abstinência de 30 dias sem beber pode ser interessante. Agora, para quem tem dependência, é possível que a pessoa volte a beber com mais intensidade depois. Lembrando que o índice mundial de pessoas com dependência varia entre 12% a 15%. No Brasil, 80% dos adultos bebem — informa Pechansky.
Os não alcoolistas que sofrerem demais durante o jejum alcoólico podem ter cruzado uma fronteira na relação com a bebida que precisa ser melhor analisada.
— Se a pessoa está com muita dificuldade de ficar muito tempo sem álcool, recomendo que ela avalie se não há um problema na sua relação com o álcool. Porque esse período de abstinência não é para ser muito sofrido — pontua Mendes Filho.