O motorista Antonio de Almeida Anaquim, 41 anos, que invadiu o calçadão de Copacabana, no Rio de Janeiro, matou um bebê e atropelou 17 pessoas na noite de quinta-feira (18), informou à polícia que teve um ataque de epilepsia antes do acidente. Ainda não há confirmação sobre o diagnóstico, mas o caso levantou a questão sobre quais são as condições médicas que impedem uma pessoa de obter uma Carteira Nacional de Habilitação (CNH).
Pela abrangência de doenças que podem colocar um motorista em risco, as regras do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) especificam poucas doenças que, de fato, são impeditivas em maior ou menor grau. Explicitamente, entram condições como epilepsia, distúrbios do sono, doenças cardiovasculares que causem perda da consciência ou insuficiência cardíaca e deficiência visual.
De uma forma geral, as diretrizes da resolução 425/2012 do Contran preferem exibir uma longa lista de condições que elevam o indivíduo ao status de condutor de risco. É o caso de quem tem problemas com atenção, memória, cognição, controle dos movimentos, discriminação de estímulos do ambiente, orientação especial, traços de psicopatologia ou possibilidade de ter uma crise que faça perder o controle do corpo. A depender do resultado, o indivíduo só poderá ter a CNH de determinada categoria ou mesmo estar apto para dirigir com algumas ressalvas. A surdez, por exemplo, não é impeditivo completo para ter uma carteira, mas pode exigir um adesivo sinalizador no veículo.
— Casos de visão monocular (enxergar apenas com um olho), deficiência auditiva ou surdez podem limitar a habilitação às categorias A (motos) e B (carros). Condutores também podem ser habilitados com restrições, como vedação (proibição) de dirigir em vias de trânsito rápido ou após o pôr do sol, ou necessidade de utilizar adaptações veiculares — afirma Paulo dos Santos Filho, da Coordenadoria Psicológica e Média do Departamento Estadual de Trânsito do Rio Grande do Sul (Detran/RS).
No caso da epilepsia, o candidato só poderá tirar a licença para carros. Usuários de medicação devem estar há um ano sem crise e seguir à risca o esquema de tratamento. Já quem está em processo de retirada de medicação precisa preencher mais requisitos, como estar há dois anos sem crise, há pelo menos seis meses sem usar a droga e há meio ano sem crise após não se medicar mais. A validade da CNH ainda pode ser reduzida.
Apesar de Anaquim alegar ter a doença, o Detran do Rio de Janeiro afirma não ter sido informado acerca da condição. No entanto, durante o processo de avaliação para obter uma CNH, o candidato deve responder a um questionário padrão com oito perguntas especificamente relacionadas à saúde: se usa remédio ou faz tratamento de saúde, se tem deficiência física, se já sofreu tonturas, desmaios, convulsões e vertigens, se já necessitou de tratamento psiquiátrico, se tem diabetes, epilepsia, doença cardíaca, neurológica, pulmonar ou outras, se já foi operado e se faz uso de drogas ilícitas.
Quem mente para o Detran pode enfrentar processo administrativo, ser submetido a uma nova avaliação médica e, a depender da determinação do médico, perder o direito de dirigir. Além disso, cabe punição penal, uma vez que, ao fim do questionário a ser assinado pelo candidato antes da obtenção da CNH, há o aviso sobre a obrigação de comunicar informações verdadeiras. "Constitui crime previsto no art. 299, do Código Penal Brasileiro, prestar declaração falsa com o fim de criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante. Pena: reclusão de um a três anos e multa".
Detran acompanha condutores por denúncia ou autodeclaração
O Detran de cada Estado se baseia na autodeclaração. A resolução 168/2004 do Contran estabelece que o indivíduo que tiver algum tipo de deficiência física para a condução de um veículo "deverá apresentar-se ao órgão ou entidade executivo de trânsito do Estado ou do Distrito Federal para submeter-se aos exames necessários". Nos demais casos, o motorista pode solicitar a renovação de exames.
— O Detran/RS também recebe denúncias ou informações sobre condutores com possível incapacidade física, mental ou psicológica para dirigir. Nesses casos, são instaurados procedimentos administrativos visando à reavaliação. Em todos os casos, a denúncia ou a informação deve ser devidamente motivada, acompanhada de um laudo médico ou psicológico. Cabe ressaltar que, mesmo que esteja habilitado, o condutor, quando não estiver em condições adequadas para dirigir, não deve assumir o volante — diz Filho.
Segundo o jornal O Globo, o condutor que atropelou os pedestres em Copacabana deveria estar com a licença suspensa por ter acumulado 62 pontos na carteira. De acordo com o Detran/RS, o processo de suspensão é instaurado quando há 20 pontos ou mais ou quando o condutor comete infrações específicas, como dirigir sob o efeito de álcool ou conduzir racha. A penalidade é ficar sem dirigir por um período de dois a 12 meses e realizar reciclagem e prova teórica. Caso haja reincidência, o direito de dirigir é cassado por dois anos.