Há mais de um ano, Ângelo Cândido convive com esgoto a céu aberto a alguns metros do trabalho, na Rua Buarque de Macedo, no bairro São Geraldo. Considerando ele e seus colegas em uma empresa de engenharia de climatização, o gerente administrativo calcula já ter recorrido cerca de 15 vezes ao telefone 156 da prefeitura de Porto Alegre — sem contar os protocolos feitos pelos vizinhos. Faça chuva ou faça sol, o esgoto segue transbordando. O sentimento é de impotência.
— O cheiro é muito forte. Para atravessar a rua, é preciso ir até a esquina. Imagina as residências do lado — comenta.
Reclamar sem sucesso não é um problema exclusivo de Cândido. A Secretaria de Serviços Urbanos (Surb) acumula 26,9 mil solicitações de serviço não atendidas nos últimos quatro anos — 22,6 mil só deste ano, segundo números até 26 de outubro. O número de queixas na secretaria é representativo, pois ali chega boa parte das reivindicações cotidianas dos moradores — como falta de água, limpeza de bueiros, pontos de alagamento, luminária apagada e manutenção em praças. Criada para centralizar os cuidados mais imediatos da Capital, a Surb recebeu do prefeito Nelson Marchezan a tarefa de tornar a cidade "bonita como um dia já foi".
— Não importa de quem é o buraco, ele tem que ser tapado — disse o prefeito quando anunciou Ramiro Rosário como secretário, em janeiro.
A rescisão de um contrato emergencial com uma empresa de manutenção de redes é uma das razões para que o Departamento de Esgotos Pluviais (DEP) tenha o maior número de pedidos não respondidos na Surb: 9.785 protocolos registrados neste ano seguem sem resposta. Outros 467 são queixas ainda de 2016. Em sua maioria, são problemas como o da Rua Buarque de Macedo: vazamentos e obstrução da rede pluvial correspondem a mais da metade das pendências de 2017 no departamento.
Temos buscado atuar nessa parte da inteligência, com aprimoramento do uso das ferramentas
RAMIRO ROSÁRIO
Secretário de Serviços Urbanos
Rosário lembra que, com o Departamento de Conservação do DEP sem serviços terceirizados por um período, houve acúmulo de serviço. No dia 9, a empresa responsável rompeu o contrato e a prefeitura precisou, mais uma vez, trabalhar com equipes próprias Um novo contrato emergencial está em andamento e deverá entrar em vigor na segunda quinzena de dezembro.
— Temos buscado atuar nessa parte da inteligência, com aprimoramento do uso das ferramentas — afirma o secretário.
Chegando ao final de 2017, com 10% dos problemas registrados neste ano ainda em aberto, Rosário admite que a prefeitura não conseguirá, sozinha, colocar todos os serviços em dia. Segundo o secretário, será necessário parcerias com a iniciativa privada. Com mais de 10 mil pedidos pendentes de intervenções em árvores nas ruas, segundo dados repassados pela Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Smams) no mês passado, Rosário aposta em um projeto do vereador Moisés Barboza (PSDB), que permite aos moradores fazer poda e corte — mesmo em via pública.
— Dar essa possibilidade de o cidadão fazer esse serviço é desafogar a prefeitura, fazendo com que os recursos existentes sejam direcionados aos locais onde isso não é possível — diz.
Em praças, metade dos pedidos está em aberto
Os serviços de manutenção de praças que a Surb herdou da Secretaria de Meio Ambiente também demandam paciência dos moradores: 49% dos protocolos feitos neste ano seguem em aberto. A falta de manutenção na Praça João Bergmann, na Rua Chavantes, indignou usuários do app Pelas Ruas nas últimas semanas: a grama alta mostrava a falta de roçada no local. Se no ano passado, o 156 havia registrado apenas 360 protocolos a respeito de capina em praça, em 2017, já são mais de 2.058 — até 26 de outubro, 150 permaneciam em aberto.
Dos pedidos relacionados à arborização (poda e remoção) deste ano, 59 foram concluídos — 149 seguem abertos. Quando o problema é nas áreas de esporte gratuitas, a situação é pior: só dois de 18 protocolos para a manutenção dos equipamentos de academia ao ar livre foram atendidos, e um dos 25 pedidos para manutenção de quadras esportivas teve solução.
Na Surb, DEP é o campeão de demandas em aberto
Ao exemplo do problema na Rua Buarque de Macedo, o setor responsável pelo maior número de serviços não respondidos é o Departamento de Esgotos Pluviais (DEP): detém 38% do total de protocolos da Surb em aberto desde 2014. Segundo o levantamento repassado pela secretaria, 9.785 protocolos registrados neste ano seguem sem resposta. Do ano passado, ainda ficaram pendentes 467. Vazamentos e desobstrução da rede pluvial são os problemas que mais geram protocolos. Somando os dois, somente neste ano, foram feitas 11.869 solicitações, e 5.311 seguem em aberto.
Nasce um pequeno lixão
Na Rua Heitor Kramer, no Guarujá, usuários do app Pelas Ruas reclamam de uma área tomada por lixo e pedaços de eletrodomésticos abandonados. A administradora Thais Fleck, que mora a uma quadra do local, relata que catadores selecionam sucata, ferro, papelão, plástico e outros tipos de materiais no local — que é área de preservação — deixando resíduos ali. Ela abriu um protocolo em 20 de outubro junto ao 156. Ligou em 13 de novembro para perguntar sobre o andamento, e foi lhe informado que havia sido encaminhado para vistoria, mas o problema não havia sido resolvido até esta quinta-feira (16). Ele era um dos 451 protocolos ainda abertos na Surb sobre focos de lixo e descarte irregular.
Outras secretarias, outras pendências
A Secretaria de Serviços Urbanos não reúne todas as queixas feitas pelo 156 — é responsável apenas pelos problemas de impacto mais direto nas ruas. Incluindo questões administrativas ou comerciais, uma consulta ao sistema do 156 da prefeitura mostra mais de 50 mil protocolos em aberto. São questões como revisão da leitura de consumo de água, por exemplo, ou devolução por revisão de conta, pelos quais há setores responsáveis nas autarquias.
Além de DEP, DMLU e Dmae, as queixas à Surb correspondem a parte das demandas das antigas Secretaria Municipal de Obras e Viação (Smov) e Secretaria Municipal do Meio Ambiente (Smam). Há outros problemas que ficaram com outras secretarias. Conservação de via pública, por exemplo, compete à Secretaria Municipal de Infraestrutura e Mobilidade Urbana (Smim) e árvores, quando não se trata de emergência, é responsabilidade da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Smams).