O jornalista Flávio Tavares lança um livro no qual narra, como repórter e testemunha, um dos episódios mais dramáticos da democracia brasileira. Com lançamento neste domingo, às 20h, na Praça de Autógrafos, 1961 - O Golpe Derrotado reconstitui em 230 páginas e 20 capítulos a resistência do Rio Grande do Sul à tentativa de impedir que o vice-presidente João Goulart assumisse a presidência após a renúncia de Jânio Quadros.
No livro, escrito após as análises e eventos que marcaram a passagem dos 50 anos do episódio, no ano passado, Tavares oferece um retrato que ajusta constantemente o foco, indo do quadro geral - as conspirações de gabinete, as ordens militares - para o microcosmo do Palácio Piratini, onde o escritor permaneceu, de 25 de agosto a 5 de setembro de 1961, como repórter do jornal Última Hora, acompanhando a resistência organizada por Leonel Brizola.
Zero Hora - Sobre o livro Memórias do Esquecimento, como foi a decisão de passar para o papel as memórias da experiência com a tortura, a prisão e o exílio?
Flávio Tavares - Não decidi escrever, mas, sim, tive necessidade de narrar. Foi uma necessidade interior, não uma decisão pessoal. Por um lado, o livro foi minha catarse e me libertou do trauma e da angústia da prisão e da tortura. Por outro, senti a necessidade histórica de transmitir o que havia ocorrido nas prisões da ditadura não apenas para que as novas gerações conheçam o horror mas, principalmente, para que a revelação evite a repetição da tragédia. Minha história foi a história de muitos mais, ou é a história da geração que sonhou terminar com a opressão e acabou sendo oprimida por quem tinha mais poder tecnológico e mais armas.
Zero Hora - Se o senhor tivesse como viver novamente aquela época faria diferente? Ou acha que foi necessária a militância para a construção de uma identidade política?
Se a ditadura e a tirania voltassem, faria igual, até como dever legado pelo passado. A rebelião contra a tirania é um direito reconhecido pela História e, com a experiência do que vivi, eu não poderia retroceder e me jogar contra a História. Mas a execução seria diferente, pois o passado atua como aprendizado e a experiência deve servir para nos melhorar, não para nos degradar. A militância contra a ditadura foi desastrosa em termos militares, pois perdemos a "guerra" e sofremos as consequências da derrota imposta pelo inimigo vil. Mas em termos da História nós vencemos. Na ética e na política, nós, os derrotados, fomos vencedores.
Zero Hora - Como foi o processo de transcrever o que viveu na cobertura jornalística da Legalidade no livro 1961 - O Golpe Derrotado?
No Rio Grande do Sul, em 1961, a palavra transmitida pelo rádio derrotou um golpe de Estado. Sim, pois foi a palavra de Brizola que construiu a mobilização popular que reuniu militares e civis, após a renúncia inesperada do presidente Jânio Quadros. Como jornalista, fui participante da Legalidade, não só quando recebemos armas para resistir ao Exército, antes de que o Exército aderisse à causa da Constituição, mas antes e depois, atuando pela informação nos jornais e na rádio da Legalidade. O editor Ivan Pinheiro Machado diz que eu narro aqueles dias como um romance de ação, em que os personagens se entrecruzam e não se sabe qual será o final.