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Tenente-coronel e ex-ajudante de ordens da Presidência no governo Jair Bolsonaro, Mauro Cid revelou em delação premiada que partiu de Bolsonaro a ordem para os comandantes das Forças Armadas divulgarem uma nota conjunta autorizando a permanência de manifestantes nos acampamentos golpistas. Cid prestou depoimento diretamente ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Os chefes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica condenaram no texto "eventuais restrições a direitos, por parte de agentes públicos". Segundo Mauro Cid, o ex-presidente "sempre dava esperanças que algo fosse acontecer para convencer as Forças Armadas a concretizarem o golpe".
"Esse foi um dos motivos pelos quais o então presidente Jair Bolsonaro não desmobilizou as pessoas que ficavam na frente dos quartéis. Em relação a isso, o colaborador também se recorda que os comandantes das Três Forças assinaram uma nota autorizando a manutenção da permanência das pessoas na frente dos quartéis por ordem do então presidente Jair Bolsonaro", diz o termo de depoimento.
A União foi condenada a pagar uma indenização de R$ 2 milhões pela nota. Na denúncia do inquérito do golpe, que atinge o ex-presidente Jair Bolsonaro e 33 aliados, a Procuradoria-Geral da República (PGR) afirma que os atos golpistas de 8 de Janeiro foram conduzidos a partir dos acampamentos e que os militares das Forças Especiais do Exército, conhecidos como "kids pretos", direcionaram as manifestações.
Monitoramento de ministros
Foi no depoimento a Moraes que Mauro Cid implicou Bolsonaro no monitoramento do ministro. Segundo o tenente-coronel, o ex-presidente pediu a aliados que vigiassem o magistrado, às vésperas do Natal.
Ao apresentar a denúncia do inquérito do golpe, a Procuradoria-Geral da República afirmou que havia uma atuação conjunta entre o ex-presidente e seus aliados na Agência Brasileira de Inteligência (Abin), a "Abin Paralela", para monitorar desafetos e espalhar fake news.
O ex-ajudante de ordens declarou ainda que Bolsonaro "não aceitou" a conclusão das Forças Armadas, que descartou a existência de fraude nas urnas eletrônicas, e pressionou o Ministério da Defesa a demonstrar a fragilidade do sistema eletrônico de votação.
Reunião na casa de Braga Netto
Mauro Cid também mencionou o general Walter Braga Netto. Segundo o tenente-coronel, Braga Netto fazia a "ponte" com os manifestantes nos acampamentos golpistas. O general foi preso no dia 14 de dezembro passado, após o depoimento de Cid.
O ex-ajudante de ordens deu detalhes de uma reunião com Braga Netto, em novembro de 2022. Conforme Mauro Cid, o encontro foi organizado para discutir a "necessidade de ações que mobilizassem as massas populares e gerassem caos social". O passo seguinte seria a decretação do estado de sítio.
"O General Braga Netto, juntamente com os coronéis Oliveira e Ferreira Lima concordavam com a necessidade de ações que gerassem uma grande instabilidade e permitissem uma medida excepcional pelo Presidente da República. Uma medida excepcional que impedisse a posse do então Presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva", declarou Cid.
Os militares chegaram a pedir dinheiro ao PL, partido de Bolsonaro, para montar a "Operação Copa 2022". Mauro Cid alegou que imprimiu o plano que detalhava a logística da operação para entregar a um dirigente do partido, "provavelmente tesoureiro ou ordenador de despesa".
O arquivo detalhava custos de deslocamento aéreo, locomoção terrestre, alimentação e "provavelmente" gastos com celulares, segundo o tenente-coronel. "O dirigente do PL disse ao colaborador que não poderia utilizar dinheiro do partido para esse tipo de operação", consta no depoimento.