
A derrubada do sigilo da delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, nesta quarta-feira (19), revelou detalhes de um dos momentos mais críticos da investigação sobre a tentativa de golpe, em que o acordo quase foi anulado em razão do vazamento de áudios do militar.
Um dos volumes tornados públicos descreve as repercussões da publicação, em 21 de março de 2024, de uma matéria da revista Veja, com o título "Em áudios exclusivos, Mauro Cid ataca Alexandre de Moraes e a PF".
Conforme a reportagem do ano passado, Mauro Cid disse, em áudios obtidos pela revista, que a Polícia Federal o teria pressionado a relatar fatos e eventos que não teriam acontecido, sob pena de perder benefícios do acordo. A publicação da matéria levou o ministro Alexandre de Moraes a chamá-lo para um depoimento no Supremo Tribunal Federal no dia seguinte. Houve ainda ordens para cumprimento de mandado de prisão e de busca e apreensão de objetos na casa do tenente-coronel.
No depoimento, realizado no dia 22 de março, às 13h, Mauro Cid confirmou a autenticidade da gravação e a classificou com um "desabafo". Foi questionado sobre quem seriam as pessoas "que se deram bem" e quem ficou "milionário".
"Estava falando do presidente Bolsonaro, que ganhou Pix, aos generais que estão envolvidos na investigação e estão na reserva. E no caso próprio (Cid) perdeu tudo. A carreira está desabando. Os amigos o tratam como um leproso, com medo de se prejudicar. Não é político, não é militar, quer ter a vida de volta. Está enclausurado. A imprensa sempre fica indo atrás. Está agoniado. Engordou mais de 10 quilos. O áudio é um desabafo", detalha o depoimento do ex-ajudante de ordens.
Cid não ficou frente a frente com Alexandre de Moraes. A audiência foi conduzida pelo desembargador Airton Vieira, magistrado assistente do gabinete de Moraes. Participaram ainda os advogados de Cid, Cezar Roberto Bittencourt e Vania Barbosa Adorno Bittencourt, além da procuradora da República, Ligia Cireno Teobaldo.
Contatos
No depoimento, Cid ainda afirmou que não teve "contato com nenhum político e ninguém do Judiciário". Questionado sobre a quem teria dito o que foi publicado pela revista Veja, disse não saber. Detalhou, ainda, com quem mantinha conversas regularmente enquanto as investigações transcorriam.
"Meu irmão Daniel Cid, meu cunhado, minha prima, meu amigo Rafael Maciel, os coronéis Sobral, Lessa que são mais próximos, eram da minha turma, e o sargento Tiago. Não tenho contato com nenhum político, ninguém do judiciário, ninguém de núcleo/esfera política", revela trecho do depoimento.
O tenente-coronel também foi perguntado sobre o interrogatório anterior feito pela Polícia Federal. Cid foi questionado se "confirmava integralmente o último depoimento prestado à autoridade policial em 11/03/2024" e se "estava acompanhado por seus defensores".
"Confirma integralmente, não foi pressionado e respondeu a todas as perguntas. Sempre esteve acompanhado por advogados, na maioria das vezes com mais de um advogado", registra o depoimento.
Cartas de militar preso
Os despachos e termos judiciais divulgados nesta quarta-feira (19) trazem ainda outras informações. Entre elas, que Mauro Cid recebeu cartas enviadas pelo major João Paulo da Costa Araújo Alves. Dois envelopes foram encontrados na residência de Cid. O teor delas não consta nos autos.
O major havia sido condenado pela Justiça Militar a dois anos de prisão por desobediência. O militar foi acusado de utilizar redes sociais para divulgar atos e ações políticas a favor do então candidato à reeleição, Jair Bolsonaro.