O vereador Ramiro Rosário (Novo) proferiu palavras de baixo calão para se referir ao juiz Gustavo Borsa Antonello, magistrado que concedeu uma liminar impedindo a votação de um projeto de lei na Câmara de Vereadores de Porto Alegre, nesta quinta-feira (23). Contrariado pela decisão judicial, Rosário vociferou contra o juiz no microfone do plenário da Câmara e, na sequência, repetiu as ofensas em entrevista à Rádio Gaúcha (ouça ao final da reportagem).
— Juiz de bosta. Juiz de bosta. E canalha — bradou Rosário, que ao microfone da Câmara, instantes antes, havia repetido o nome do magistrado.
Segundo o vereador, os xingamentos se justificam uma vez que o magistrado está interferindo em decisões políticas da Câmara:
— Nesse caso concreto ele (o juiz Gustavo Borsa Antonello) é um canalha porque ele interfere dentro do Poder Legislativo, ele faz com que a nossa cidade, na verdade a gente, esteja perdendo o nosso tempo aqui, todos nós estamos perdendo o nosso tempo. Então é o seguinte, se a Câmara de Vereadores e a Prefeitura de Porto Alegre não podem fazer as suas escolhas constitucionalmente previstas e que a população nos delegou, então que a gente vá para casa, não faça mais absolutamente nada e que o Judiciário comande. O Judiciário assume a Prefeitura de Porto Alegre, assume o governo do Estado, assume a União, o governo Federal — disse Rosário.
O vereador ainda defendeu que a forma de lidar com casos como esse é de expor os nomes e fotos dos magistrados:
— Cada vez mais a gente precisa expor esses juízes, expor os nomes deles, expor as fotos e é isso que eu vou fazer, porque nós somos cobrados pela sociedade quando a gente vai no supermercado, quando a gente anda na rua, nós somos cobrados de forma legítima e eu adoro ser cobrado. Esse juiz merece sim ser exposto. O nome dele, a foto dele, para que ele também seja cobrado pela sociedade quando ele andar na rua — disse Rosário.
Na decisão liminar, o juiz Gustavo Borsa Antonello acolheu os argumentos da vereadora Natasha Ferreira (PT) e paralisou a votação, que ocorreria na Câmara da Capital, do projeto de lei de autoria do prefeito Sebastião Melo que altera a estrutura do Dmae e transforma o conselho deliberativo em conselho consultivo.
Tribunal de Justiça e Ajuris repudiam fala do vereador
As ofensas contra o juiz foram repudiadas pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) e pela Associação dos Juízes do RS (Ajuris).
Em nota enviada à reportagem, o TJRS afirmou que os xingamentos ferem o decoro da Câmara e atingem "frontalmente a relação harmônica entre os Poderes".
"A mensagem se constitui, claramente, em uma tentativa de ameaça ao Estado Democrático de Direito. Tal comportamento não condiz com a tradição do Legislativo Porto-alegrense, de onde emergiram, ao longo da história, grandes referências políticas para o país", aponta o TJRS.
Já a Ajuris diz que a fala de Ramiro Rosário "é inaceitável". "A manifestação transborda do legítimo direito do exercício da liberdade de expressão parlamentar para se transformar em um vil ataque à autonomia dos Poderes, podendo configurar quebra de decoro parlamentar e ato ilícito a ser apurado nas esferas cíveis e criminais competentes", afirma a nota.
Ouça a entrevista do vereador à Rádio Gaúcha
Leia a nota do TJRS
"NOTA DE REPÚDIO
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul repudia, veementemente, as manifestações afrontosas e antidemocráticas proferidas pelo vereador Ramiro Rosário na tarde de hoje (23/01). Ao insultar o Poder Judiciário gaúcho e dirigir ofensas pessoais a um magistrado, utilizando termos de baixo calão, o parlamentar fere o decoro da Câmara Municipal e atinge frontalmente a relação harmônica entre os Poderes. A mensagem se constitui, claramente, em uma tentativa de ameaça ao Estado Democrático de Direito. Tal comportamento não condiz com a tradição do Legislativo Porto-alegrense, de onde emergiram, ao longo da história, grandes referências políticas para o país. O Judiciário tem a função de resguardo da legalidade e obediência aos limites constitucionais estabelecidos, ainda que contrário aos interesses de determinados grupos e não admitirá ataques a sua autonomia, nem à Democracia.
Desembargador Antonio Vinicius Amaro da Silveira
Presidente do Conselho de Comunicação Social".
Leia a nota da Ajuris
É inaceitável a manifestação do vereador Ramiro Rosário proferida na tarde desta quinta-feira (23/1) na Câmara de Vereadores de Porto Alegre. A manifestação transborda do legítimo direito do exercício da liberdade de expressão parlamentar para se transformar em um vil ataque à autonomia dos Poderes, podendo configurar quebra de decoro parlamentar e ato ilicito a ser apurado nas esferas civeis e criminais competentes.
Tão grave quanto promover uma ruptura entre os Poderes é o anúncio do vereador de revelar dados pessoais do juiz que, em seu pleno exercício da função, proferiu decisão sobre caso a que foi provocado a se manifestar. Ameaçar revelar dados pessoais do juiz faz com que o vereador seja responsável pelo comprometimento da segurança física dele e de sua família.
A Associação dos Juízes do RS (AJURIS) não aceita que em nome do debate político, promovido por qualquer matriz ideológica, as juízas e juízes gaúchos sejam covardemente atacados. A democracia é sustentada pelo debate de alto nível e tem, no Judiciário, poder soberanamente constituído por decisão do povo brasileiro.
Cristiano Vilhalba Flores
Presidente da AJURIS