Tramita na Câmara de Vereadores de Caxias um projeto de lei complementar que define novos índices de contribuição do município à previdência social dos servidores públicos municipais. A proposta prevê a manutenção dos 42,04% atualmente pagos até dezembro de 2022. O percentual representa em torno de R$ 192 milhões em cada ano, ou R$ 384 milhões na soma do período, estimativa a partir de valor médio, variável com a folha salarial.
Em 2020, o Executivo repassou cerca de R$ 139 milhões, ou mais de R$ 50 milhões do que o encargo anual previsto para este ano e o próximo. Além desse valor, o município injeta 16,92% da contribuição patronal à previdência do funcionalismo, o que corresponde a cerca de R$ 84 milhões/ano. Apesar de já representar uma fatia considerável da receita, o maior impacto da dívida projetada seria em 2023 e 2024, quando é previsto aumento de 26,41 pontos percentuais da alíquota, que passaria de 42,04% para 68,45%. O acréscimo geraria uma dívida anual de R$ 330 milhões, ou seja, quase R$ 200 milhões a mais do que o repassado em 2020.
A situação, que já é grave, especialmente considerando o contexto de gastos elevados em razão da pandemia, se tornaria progressivamente insustentável do ponto de vista das finanças públicas e comprometeria capacidade de investimentos e custeio da administração em médio prazo.
– Termos conseguido a manutenção da alíquota (suplementar) em 42,04% (até 2022) já é um avanço para o município conseguir se reestruturar neste ano complicado em razão da pandemia. Mas a gente vem verificando algumas condições, estamos solicitando revisão dos valores do cálculo atuarial até para uma projeção mais realista – comenta o secretário de Parcerias Estratégicas e Gestão de Recursos, Maurício Batista.
A legislação federal permite que os municípios possam parcelar em até 35 anos a dívida previdenciária do funcionalismo público, a contar de 2020.
Conforme o projeto atualmente sob análise da Comissão de Constituição, Justiça e Legislação (CCJL) – sem previsão ainda de ir a plenário –, após 2024, no período que de 2025 a 2055, o município precisaria contribuir com alíquota de 66,17% para cobrir o déficit previdenciário projetado até lá, de R$ 5,7 bilhões. Esse valor, no entanto, considera cálculos hipotéticos de estimativas de quando é projetado de aumento gradativo de inativos e quadro de servidores ativos até 2055. Os cálculos atuariais que definem os percentuais de contribuição são refeitos anualmente e podem, portanto, ser revisados quando verificada mudança de cenários, com déficit ou aumento de servidores e redução ou incremento do quadro de inativos, por exemplo.
Nesta sexta-feira (30), haverá sessão de julgamento da licitação para contratação de uma nova empresa para assessorar o Instituto de Previdência e Assistência Municipal (Ipam) na realização da avaliação atuarial e para propor alternativas para equacionar o déficit.
ALÍQUOTAS E APORTES
- 2020: R$ 139 milhões (28,04%)
- 2021: R$ 192 milhões (42,04%) *
- 2022: R$ 192 milhões (42,04%)*
- 2023: R$ 330 milhões (66,17%)
:: Alíquota patronal: 16,92% (em torno de R$ 84 milhões/ano).
:: Alíquota de servidores é de 14%.
*estimativas
Valor de leilão de cerca de 40 terrenos para compensar aporte
Embora o cálculo atuarial permita a revisão constante das alíquotas, empurrar maiores índices para o futuro não seria uma solução sustentável a longo prazo, considerando que incidiriam reajustes e juros sobre os repasses. Ao governo municipal, resta buscar alternativas de amenizar a dívida atuarial — e, consequentemente, reduzir os encargos —, bem como encontrar formas de repensar o regime previdenciário do funcionalismo público. De acordo com o secretário municipal de Parcerias Estratégicas e Gestão de Recursos, Maurício Batista, o governo planeja utilizar esse intervalo de congelamento da alíquota nos 42,04% para tentar implantar medidas que influenciem na retração eventual da dívida.
— Fizemos levantamento através da Secretaria de Planejamento de vários imóveis, terrenos, basicamente, que para o município não há interesse em ocupar, em variados portes, e que estaremos procedendo a leilão. Inicialmente, o levantamento indica cerca de 40 imóveis, uns totalmente regularizados, outros com necessidade de ajuste de matrícula, mas a ideia dessa iniciativa é que façamos o leilão e revertamos o valor da alienação ao Ipam, de certa forma compensando o aporte que o município faria neste ano ou no próximo, quando ocorrer o leilão — revela.
Ainda não há estimava de quanto o valor a ser obtido abateria da dívida.
Além da medida, Batista também ressalta a intenção da administração em avançar nas reformas da previdência e administrativa, cujas tratativas e elaboração não iniciaram, mas devem mobilizar um grupo de trabalho formado pelo Executivo, Ipam e Sindiserv.
— A reforma administrativa tem objetivo de equalizar várias condições que existem no serviço público. Temos, às vezes, servidores que ocupam a mesma função, mas com salários muito diferentes, pois ingressaram na prefeitura sob leis diferentes. O objetivo do governo é que façamos essa reforma e corrijamos essas discrepâncias em termos de remuneração. Obviamente, é importante que façamos ajustes em gratificações, mas algo que seja coerente e não venha a penalizar o servidor, mas que consigamos manter o serviço público — afirma.
A intenção, conta Batista, é iniciar a discussão sobre as reformas ainda neste ano.
BOM PARA OS DOIS LADOS
O secretário alega que as mudanças estruturais não retirariam direito ou visam penalizar os servidores, mas buscar equilíbrio sustentável das finanças do município e da própria capacidade do Ipam.
— Temos vários modelos no Brasil de instituições previdenciárias públicas que não têm condições de manter seus inativos e que agora ficam num cenário de aflição por não ter garantia de receber sua aposentadoria. Por isso, é importante construir isso e resolver esse problema. Essa é uma situação que vem se arrastando há muitas gestões e vem sendo postergada ano a ano — comenta.
"A conta chegou"
Na visão do atual presidente do Ipam, Flávio Carvalho, em retrospecto hipotético, a dívida não teria ocorrido e, consequentemente, teria dispensando a alíquota atuarial se houvesse sido injetado aporte de valores suficientes para pagamento de todos os benefícios de aposentadoria e pensão por morte na criação do Fundo de Aposentadoria e Pensão do Servidor (Faps) em 2001. Cenário, no entanto, que reconhece como improvável mesmo naquela época.
— Como seria praticamente impossível de dispor desses valores, se em vez de 13,28% (alíquota da contribuição suplementar da época), houvesse a indicação de 26%, por exemplo, certamente os números não teriam chegado a esses patamares — acredita Carvalho.
Ele explica que em parte, a situação também foi gerada pela falta de regramento mais específico com relação aos percentuais de repasse aos regimes de previdência permitidos pelo governo federal na época:
— No início, o Ministério da Previdência admitia percentuais inapropriados em relação ao passivo. Seria o mesmo que financiar um automóvel e a financeira permitisse o pagamento de qualquer valor nos primeiros meses, rolando a dívida para as parcelas finais. Em determinado momento da transação, o banco não aceitou mais "qualquer" valor e definiu que devem ser pagos os valores correspondentes ao tamanho efetivo da dívida. A conta chegou, e é este o momento que o município está enfrentando — explica.