Penso na generosidade de Dona Isolina Castelaci, 83 anos, e me lembro de Drummond: "que pode uma criatura senão, entre criaturas, amar?". O amor é a explicação, a luz e a cura. É best-seller, como mostra a capa do Almanaque deste final de semana. É piegas, é clichê. Mas é o que os move (ou, ao menos, deveria mover).
Contei no Facebook sobre meu encontro com Dona Isolina, dias atrás. Ela me procurou porque gostava dos meus textos e tinha ficado tocada especialmente por um dele, em que homenageava minha mãe. Ela percebeu que havia "muito amor no meu coração" e que esse sentimento não estava em mim a troco de nada. Fui convidada a visitá-la e, sentada no sofá da sala, na moradia atrás do Estádio Municipal, ela me contou o motivo do contato: tinha uma ligação importante com minha família, havia recebido muito amor dos meus avós maternos, num momento triste da vida, quando estava prestes a perder uma das filhas, aos 10 meses. Isso aconteceu em 1958. Pensa: minha mãe era uma criança pequena!
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Ela ainda lembrava e fez questão de dividir comigo a recordação. Buscou fotografias e documentos. Quis devolver a mim o amor que recebeu, porque achou importante que eu soubesse como a minha família é linda. Nos abraçamos com ternura. Ao dividir a história e o carinho, acabou multiplicando uma sensação de bem-estar, proporcionada pela propagação do amor, como se fosse uma corrente.
A ciência já explica que o amor modifica as conexões do nosso cérebro, transforma quem nós somos – e isso permanece. Quando a gente gosta de alguém, nossos neurônios são ativados de uma forma específica – e eles são "ligados" cada vez que lembramos da pessoa amada (estando ela aqui ou não). Ativamos essas redes e elas evocam os motivos que nos fizeram gostar da pessoa. É também o que possibilita prolongar a existência (não só de forma figurada, mas literal) de alguém que não está mais aqui – no caso, meus avós ou Rosana, a filha de Dona Isolina. Aí lembro dos versos cantados por Caetano, em Mora na Filosofia: "pra quê rimar/ amor e dor", que agora fazem sentido.
Num gesto singelo e forte, Dona Isolina mostrou ainda mais: amor não se pede – e só quem já o vivenciou sabe reconhecer a importância de amar, consegue enxergar o outro em sua plenitude e imperfeição e tem a capacidade de fazer esse sentimento delicioso transcender.
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