Eu sempre me pego nesse limiar entre o que posso ser e o que sou. Uma escritora que não quer se perder em conceitos grandes, mas se reencontra nas entrelinhas do cotidiano. Aquela que poderia ser uma trombonista, pilota de avião, mas que, na verdade, é só uma mulher que escreve porque precisa e porque não consegue viver sem. Às vezes, me pego pensando que sou mediana, constato que, de fato, sou. A maioria das pessoas é.
É engraçado, mas essa medianeidade é a minha grandeza. No meu mediano, encontro o que me faz seguir em frente. Eu consigo, de alguma forma, falar com as pessoas e, isso, no final, é o que importa. Consigo falar com minha mãe, que nunca teve um diploma, mas que tem algo muito mais valioso: o sentimento. Ela me ensina todos os dias o que é realmente importante. E se sou capaz de falar com ela, sou capaz de falar com qualquer um. O moço da esquina que vende guarda-chuva, o senhor que vende abacaxi no mercado, o vendedor da loja de rua, a amiga no café. E você.
No fundo, esse meu jeito de ser gentil, de ter uma alma precária e ao mesmo tempo intensa, faz de mim quem sou. Não sei muito de grandes coisas como dinheiro ou status, mas sei dos caminhos da vida. Daquelas pequenas coisas que moldam o nosso ser sem a gente perceber. Somos todos precários. E é nessa precariedade que talvez resida nossa maior beleza. Eu sou feita de ausências, falhas, de uma falta de domínio sobre tudo. Sou também feita de escolhas, algumas fáceis, outras nem tanto. Escolho olhar para o mundo com olhos de quem sabe que nada é perfeito, mas que isso não quer dizer que não seja bonito. Escolho ser escrita nas linhas tortas do meu próprio destino, porque é ali que encontro o que vale.
Clarice Lispector disse: escrever é uma forma de me salvar. E é nesse espaço, nessa dúvida existencial, que me encontro todos os dias. Me encontro escrevendo, me encontro lendo, me encontro buscando palavras que possam traduzir essa inquietação que é ser mulher-escritora-mãe-mediana-plena.
O mais curioso é que, ao longo de minha vida, descobri que a minha fragilidade é a minha força. A mesma fragilidade que me torna mínima no cotidiano das grandes coisas é a mesma que me permite ver o mundo de uma forma mais nítida, mais próxima. Não é pelo grande palco que as pessoas se reconhecem. Não é pelo reconhecimento das massas que a verdadeira troca acontece. Ela está nas pequenas conversas, nos detalhes, nas coisas simples que, no final, são as mais poderosas. A vida é feita dessas coisas. Como diria minha heroína das palavras, Adélia Prado: a poesia mora onde a gente menos espera. E, em muitos momentos, a poesia mora na minha vida cotidiana, nas conversas banais, nas risadas na mesa de jantar, nos braços que se estendem quando preciso, nas palavras ditas de forma despretensiosa, mas que, de alguma forma, transformam.
Na minha medianeidade, encontro a verdade. A verdade de que não preciso ser a melhor em tudo, mas preciso ser o melhor de mim mesma. E talvez isso seja o suficiente. Porque é na imperfeição que sou inteira, é no incerto que encontro segurança. E, no final das contas, isso é o que importa. Quando escrevo, não escrevo para ser admirada. Escrevo porque só assim posso existir. E se isso significa ser mediana, então que seja.
Ser mediana nunca foi tão incrível.