Ela sabia. Desde muito cedo, sabia. Não importava o que viesse — os cansaços, as paixões desencontradas, os dias sem sol —, havia nela um pacto silencioso com o destino: nunca sucumbir. O corpo podia fraquejar, os olhos podiam arder, a voz podia falhar. Mas o que habitava dentro dela, aquele núcleo incendiário de quem nunca se permite cair para sempre, isso não se apagava. Ela ardia, como sua mãe antes dela, como a avó que suportou secas e esperas, como todas as mulheres que aprenderam a seguir sem que alguém as ensinasse.
A vida, essa entidade incontrolável e por vezes cruel, costumava se debruçar sobre ela com um misto de ironia e desdém. Colocava pedras no caminho, arrancava-lhe amores, empurrava-a para precipícios emocionais e, por fim, observava de longe, esperando o momento da desistência. Mas ela não desistia. Nunca desistiu. Aprendera cedo que sua força não era uma escolha, era um decreto. Ser mulher era ser, ao mesmo tempo, correnteza e represa, tempestade e abrigo, fogo e cinza. Era ser própria e ser de todo mundo.
Quando o vento soprava contra, ela dançava com ele. Quando a solidão apertava, escrevia para si mesma como quem escreve a uma amiga antiga: Vai passar! E passava. Quase sempre passava. Nos dias em que não passava, ela se permitia um intervalo: um cigarro tragado na sacada, um gole de café quase frio, um olhar para o teto na esperança de encontrar ali um sinal divino. Depois, levantava e seguia. Não sabia esperar. Tinha pressa de seguir.
Gostava de pensar que a vida a testava por puro divertimento. Mas, se era um jogo, ela jogava bem, mesmo sem saber as regras. Sabia engolir o choro até que ele virasse força, sabia rir na cara do improvável, sabia reinventar a própria alma toda vez que a vida a quebrava. E quebrava muito. Mas qual mulher nunca quebrou? Qual mulher nunca precisou catar seus pedaços e colá-los à base de saliva e coragem?
E no meio disso tudo, no caos cotidiano, nas pequenas batalhas diárias, ela encontrava brechas de encanto. O sol entrando pela fresta da janela. O riso despreocupado da cria. Um verso de Caetano que dizia tudo o que ela não conseguia verbalizar: Gente nasce, morre, todos os dias... Gente vive, morre, todos os dias...
Ela sabia. Desde muito cedo, sabia. E, se você, leitora, ainda duvida que vai aguentar, olhe para trás. Olhe o que a vida já fez com você e o que você fez com a vida de volta. Aguentar não é escolha, é destino. E, no fim das contas, você sempre aguentou. Sempre se levantou. Sempre encontrou um motivo, por menor que fosse, para dar o próximo passo. Porque dentro de você, como dentro dela, habita algo inquebrantável. Algo maior que a dor, mais profundo que o medo. Você não é feita para parar. Você é feita para ir além.