

Era domingo. No relógio, poucos minutos depois das 8 horas da manhã. Enquanto enfrentava uma terrível crise de insônia, o celular apitou, e, já pensando no pior, encontrei uma mensagem de um desconhecido. Recebi via WhatsApp uma imagem muito colorida com uma frase assinada por Clarice Lispector, a qual dizia que os homens admiráveis são aqueles que conseguem ser fortes até mesmo nos dias nublados. Ao abrir a janela (da vida real), duas certezas: 1ª) estava nublado 2ª) eu definitivamente odeio o WhatsApp.
Tá certo, na verdade faltou incluir uma terceira certeza: Clarice Lispector nunca escreveu isso. Porém, como qualquer recurso que esteja atrelado à internet pode ser uma grande mentira mascarada, esta também não deixou de ser. Levou um curto tempo para que eu descobrisse que o indivíduo que me deu bom dia era um ex-colega de um ex-curso de uma ex-vida que nem devo me lembrar. E, sim, ele se preocupou em me mandar uma imagem de bom dia.
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Vivo dizendo por aí que acho que nasci na época errada. A reclamação é um pouco contraditória, porque por mais que eu adore cartas e longas conquistas, eu realmente gosto de viver conectado. Talvez eu seja uma mistura do meu pai, que adora trocar vídeos e piadas pelo aplicativo, com a minha mãe, que simplesmente odeia todas as vezes que o celular do meu pai faz alarde quando entra uma nova mensagem. Mas uma coisa é certa: nenhum de nós está livre.
Já pensei diversas vezes em apagar o aplicativo. Porém, o tal do "Zap Zap" é o mal mais necessário que o homem já criou. Diferentemente do Facebook, onde você pode simplesmente levar um tempo para responder ou até mesmo fingir que não leu, o WhatsApp é como uma rua sem saída. Existe cobrança, e ela é quase sempre imediata. Quando eu desativei o recibo de leituras, meu Deus!, foi como um incêndio entre os meus contatos. Por que você não leu? Por que você não responde? Você demora muito!
Demoro. Demoro porque gosto de longas conversas, daquelas com profundidade e relevância. Não quero imagens de bom dia, dispenso trivialidades, e simplesmente prefiro jogar papo fora cara a cara. WhatsApp para mim é trabalho, é facilidade, é cortar caminho. E só.
Sortuda mesmo é a minha mãe, que para alguns olhos deve ser um tipo de extraterrestre. Onde já se viu em pleno 2017 não ter WhatsApp? Certa ela. Ou sortuda mesmo talvez seja Clarice Lispector, que nem chegou a conhecer o WhatsApp. E olha que lá pelos anos 50 ela já resumia muito bem esta crônica: a solidão é um luxo.