
Desde que o uso de celulares foi proibido nas escolas do Brasil, uma parcela crescente das falhas no sistema educacional tem sido atribuída aos professores. Acusados cada vez mais de “doutrinar” as crianças, como se o simples ato de ensinar história ou ciências fosse uma conspiração para moldar ideologias secretas, muitos pais e responsáveis (sem generalizar, é claro) têm vilanizado uma classe que, por natureza, já enfrenta desafios imensos. Em meio a essa batalha de desconfianças, alguns insistem em bradar: a culpa é do professor.
Sim, existem professores ruins. Da mesma forma como existem advogados ruins, médicos ruins, policiais ruins e até veterinários ruins. A diferença é que isso é exceção, e não regra. O que vemos frequentemente, no entanto, é o tão discutido “viés de confirmação”. Ou seja, muitos pais buscam apenas informações que reforçam suas desconfianças, ignorando a realidade de que a grande maioria dos professores trabalha com dedicação, amor e seriedade. São profissionais que passam horas preparando aulas, corrigindo trabalhos e tentando, com todo empenho, transmitir conhecimento e formar cidadãos críticos e conscientes. Mais do que nunca, professores enfrentam não só a desvalorização de sua profissão, com uma remuneração baixíssima, mas também uma crescente onda de desconfiança e acusações infundadas.
Não o bastante, o professor acumula agora mais uma função: a posição de fiscalizar o uso das tecnologias para garantir que elas sejam usadas de forma construtiva para o aprendizado. Uma tarefa que, teoricamente, deveria ser compartilhada com e por todos os pais, mas que, na prática, acaba recaindo sobre seus ombros.
Augusto Cury, em seus livros e palestras, reforça que o papel de educar, no sentido de formar o caráter, desenvolver valores e habilidades emocionais, é dever da família. A escola, cada vez mais servindo de terceirizadora da criação, deveria restringir-se ao papel de ensinar.
E aí entra a polêmica do celular. Se antes as crianças podiam registrar qualquer evento suspeito ou momento desconfortável na escola, com a proibição dos aparelhos móveis, muitos pais passaram a ver isso como uma ameaça. Como saber se algum professor cometeu algo errado? Como garantir que não haja injustiças? O celular virou um tipo de “filtro de segurança”, como se fosse a única ferramenta que poderia garantir que nada fosse encoberto. E, de fato, muito é encoberto: o uso em excesso dos dispositivos móveis tem criado jovens cada vez mais isolados, distraídos e menos capazes de se concentrar nas interações reais e significativas. São tempos sombrios onde a pergunta que fica é: se não confiarmos nos professores, em quem poderemos confiar? A meu ver, este é um passo grotesco e potencialmente sem volta.
O grande desafio, portanto, não está em buscar um culpado, mas em entender que a educação é um esforço coletivo. Os professores não são os únicos responsáveis pelos problemas da sala de aula, e os pais não podem simplesmente terceirizar a criação dos filhos e esperar que a escola resolva tudo. Se realmente queremos que as coisas melhorem, o primeiro passo precisa ser a confiança mútua — e não a busca incansável por um culpado. Com pesquisas apontando que, em 2040, o Brasil enfrentará um déficit de 235 mil professores se nada mudar, a pergunta deixará de ser: “De quem é a culpa?” e passaremos a questionar: “Quem irá educar nossos filhos?”.