Conforme a época e a cultura vigente, os povos definem o que é aceito ou rechaçado em assuntos considerados tabu. O sexo, naturalmente, sempre foi um deles. Salvo em raras sociedades, quando a livre expressão era permitida e praticada, nossas concepções foram comprometidas pelo olhar enviesado das religiões e da moral. Elas atuaram como inibidores que não permitem a vivência plena do que rege a sensualidade. A filosofia e a psicologia tentaram contribuir para a diluição de normas tão estanques. Mas, a despeito de como tudo foi sendo tratado ao longo dos tempos, inevitavelmente acabou se tornando um centro irradiador de poder. Vale enfatizar que aqui não estamos falando de algo que pertence ao racional, à lógica do pensamento. Assim, o encontro físico, o êxtase que ele provoca, acaba resvalando para a dominação. Um subjugando o outro, em busca da ocupação de um espaço na geografia emocional alheia. Lembremos da emblemática peça de teatro Lisístrata, do grego Aristófanes. O enredo apresenta a luta das mulheres para dar fim a uma guerra que se arrastava há anos, afastando seus maridos de casa. Sua arma: não ir mais para a cama com eles. Vinte e cinco séculos desde então e parece que nem tanta coisa mudou. Além disso, mesmo sabendo-nos donos do nosso corpo, comumente acabamos por obedecer aos seus ditames. Ainda mais em quem desperta em nós os apetites que o roçar da pele evoca.
Somos vítimas e, ao mesmo tempo, agentes dessa poderosa força que emana do embate sexual. O título deste texto não pode prescindir da interrogação. Sempre haverá polêmica quando nos referirmos a ele. Acima de tudo, cabe-nos internalizar conceitos destituídos dos dogmas que costumam ser transmitidos de geração em geração. Este é um ponto nevrálgico que continua contaminando as relações amorosas. Reduzi-lo a um simples instinto ao qual nos submetemos cegamente, não ajuda na tarefa de jogar luz sobre este que é o mais inesgotável dos temas. Ele está presente nos consultórios médicos e nas conversas ligeiras; nas litanias vociferadas no alto dos púlpitos e nas incontáveis horas de análise entre paciente e terapeuta. Somos, inevitavelmente, fruto destes dias de tudo fazer e tudo sentir, mas podemos converter o fatalismo num substrato para a mudança, ultrapassando-o.
Não há nesta reflexão a ideia de esgotar uma vertente tão complexa, mas sim de continuar indagando, até descobrir o que causa tanta celeuma, num universo que deveria ser povoado unicamente pelo prazer. Somos convidados a abrir algumas janelas que costumam permanecer fechadas por uma espécie de pudor ancestral. Talvez, apelando para nossa sensibilidade, possamos colocar lado a lado duas palavras que inúmeras vezes habitam casas opostas: amor e sexo. Afinal, seres libertos não desejam estar no comando, pois sabem que a entrega é a maneira mais sábia de pertencer a si e ao outro. Sem a tensão da posse que nos rouba a alegria de simplesmente ser.