Muitas vezes, na vida, fingimos não estar sentindo nada. Não sentimos raiva, não nos angustiamos, não deixamos a frustração e a infelicidade nos visitar, como se, magicamente, ao negar, resolvêssemos o que nos machuca. Gosto de pensar que nós não somos o rio da vida. A vida corre seu curso da sua maneira, às vezes mais forte, às vezes mais branda, mas independe de mim, de ti e de qualquer um. A vida é maior que todos nós juntos. Somos o leito desse rio. Vamos nos moldando conforme ela vai passando por nós. E, jamais poderemos evitar esse movimento. Aprender a perceber o que passa por nós e nos atravessa nos prepara para conseguir interpretar a experiência humana.
Na maioria das vezes somos uma espécie de malabarista de sentimentos com pouco treino. Testemunhamos a tristeza, o sofrimento, a angústia, as perdas, se alterarem em nós sem conseguirmos parar esse jogo de ansiedade e simplesmente sentir cada um deles. Temos medo do que esses sentimentos poderão fazer conosco. Temos medo de nos sentirmos errados, pois todos ao nosso redor, nas mídias sociais parecem tão felizes. Não fomos ensinados a aceitar que há dias em que não estaremos bem. Que há dias em que amanhecemos nublados e que tal como, com o passar das horas o tempo volta a abrir, ou não. Mas isso não significa que está tudo errado. Nessa exigência constante de ser feliz e aparentar se feliz, essa coisa desesperada pela felicidade, na verdade só nos angustia mais ainda. Não somos felizes o tempo todo, ousaria dizer que, na maioria das vezes, somos frustrados pela realidade que nos joga sempre de volta ao início. No entanto, embora estejamos frustrados, descobrimos aos sermos honestos com o que se passa conosco, que nem tudo é frustrante. Descobrimos que no meio da tristeza, nem tudo é triste, ainda sobra espaço para sorrir e se emocionar com o belo da existência humana. Quando negamos o que se passa conosco, isso nos define. Quando aceitamos, acolhemos, crescemos. Acredite, sentimentos não vividos não vão embora. Eles ficam ali como feridas mal curadas. Às vezes infeccionam, noutras doem mas, continuam ali. Às vezes nos rasgamos, metaforicamente, noutras nos cortamos mesmo, nos machucamos e então fico pensando quanta urgência de sentir, de sangrar, de encontrar uma saída. Sentimentos também infeccionam.
Cada um de nós carrega sua verdade inesperada e por mais doloroso que possa ser viver e sobreviver com (e apesar de) nossas falhas, quando admitimos que não somos perfeitos, nem completos, nem inteiros, descobrimos que somos humanos. Nossos problemas podem ser diferentes, mas nossa posição na vida é a mesma, ou seja, a de alguém que busca respostas, e não eco, para os próprios abismos.
Nossos sentimentos podem ser ótimos professores sobre nós mesmos, mas para isso, é preciso ouvi-los.