Em um ambiente com avanço da especialização, pessoas com maior formação viram sua renda cair com mais força no Rio Grande do Sul. O rendimento médio real habitual do grupo com Ensino Superior completo ou equivalente recuou 12,26% no Estado no intervalo de 12 anos, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) trimestral, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No outro extremo, a população com menos escolaridade teve alta de 60,63% nos valores médios recebidos.
Avanço na oferta de cursos superiores em ritmo diferente da demanda por esse tipo de trabalhador está entre os principais fatores que explicam esses movimentos, segundo especialistas.
No terceiro trimestre de 2024, o rendimento médio real habitual do grupo Ensino Superior completo ou equivalente bateu nos R$ 6.708. No mesmo período de 2012, a cifra era de R$ 7.645, conforme valores corrigidos pela inflação. Mesmo assim, essa classe segue no topo em valores absolutos. Já o rendimento médio do ramo sem instrução e menos de um ano de estudo saltou de R$ 1.369 para R$ 2.199 nesse intervalo de tempo.
O coordenador da Pnad Contínua no Estado, Walter Rodrigues, afirma que um dos aspectos que ajudam a explicar a diferença na variação de renda entre esses dois grupos está ligado ao tamanho de cada um dentro do Estado ao longo dos anos. A massa com maior escolaridade aumentou nesses 12 anos, enquanto a outra ponta encolheu, segundo Rodrigues.
É uma questão de oferta e de procura. Se tem pouca gente no Estado com baixa escolaridade, essas pessoas são mais disputadas para exercerem ocupações que não requerem escolaridade.
WALTER RODRIGUES
Coordenador da Pnad Contínua no RS
Dados da Pnad reforçam a análise do pesquisador. O Rio Grande do Sul contava com 274 mil pessoas com 14 anos ou mais sem instrução e menos de um ano de estudo no terceiro trimestre de 2012. Em 2024, esse grupo caiu para 209 mil — recuo de 23,72%. Já o contingente de pessoas com Ensino Superior completo ou equivalente saltou de 884 mil para 1,721 milhão entre os dois períodos — avanço de 94,68%.
Lisiane Fonseca da Silva, economista que atua na área do mercado de trabalho e é professora da Universidade Feevale, afirma que o aumento no número de pessoas com Ensino Superior responde a uma série de incentivos — como financiamentos estudantis e diversidade de opções de instituições de ensino. No entanto, afirma que a queda na renda parece refletir inchaço em algumas áreas.
Tem algumas áreas hoje em que a demanda mudou e a gente tem uma oferta de mão de obra com curso superior maior do que a demanda. Isso acaba impactando no achatamento de salário, porque tudo aquilo que sobra, que é excedente, a tendência é ter uma queda no seu preço.
LISIANE FONSECA DA SILVA
Economista e professora da Feevale
Lisiane afirma que, além disso, pessoas com maior formação acabam mais direcionadas para a área de atuação, enquanto trabalhadores menos qualificados tem mais versatilidade na hora de se inserir no mercado de trabalho. Isso também afeta a demanda e a oferta de mão de obra.
Olhando em um recorte de tempo menor, a faixa com maior escolaridade apresentou avanço. No entanto, além de perder para o início da série histórica, segue abaixo do valor verificado no pré-pandemia, em 2019 (veja no gráfico a seguir).
No país
A queda no rendimento das pessoas com Ensino Superior ocorre no mesmo patamar do tombo observado no país no período. No entanto, o avanço no valor médio recebido por pessoas sem formação cresceu em ritmo mais acelerado.
O coordenador da Pnad Contínua no Estado afirma que essa diferença no avanço da renda no grupo com menor escolaridade pode ser explicada em parte pelo fato de o Rio Grande do Sul ter uma população mais envelhecida e menos potencial de mão de obra em faixas mais iniciais. Com menos trabalhadores que se encaixam nesse quadro, o valor médio pago pelos empregadores cresce com mais força no Estado.
O Ensino Superior vai se tornar a régua para entrar no mercado de trabalho.
MOISÉS WAISMANN
Coordenador do Observatório Unilasalle: Trabalho, Gestão e Políticas Públicas
Próximos anos
O professor Moisés Waismann, coordenador do Observatório Unilasalle: Trabalho, Gestão e Políticas Públicas, afirma que, com o avanço na população com Ensino Superior, ter essa graduação pode deixar de ser um diferencial e torna-se cada vez mais um pré-requisito:
— Até agora, ter Ensino Superior me garante maiores rendimentos no mercado de trabalho. Mais para frente, ter curso superior vai ser a minha condição para entrar ou não no mercado de trabalho.
Já a professora Lisiane Fonseca afirma que o comportamento da renda entre as classes de instrução vai depender da dinâmica econômica no Estado nos próximos anos:
— A questão é essa, como é que eu vou pluralizar essa mão de obra em outros segmentos. Porque na medida que o mercado começa a exigir uma qualificação maior, essa demanda tende a crescer por essa mão de obra. Claro que vai ser uma adequação entre o que o mercado oferece e o que está sendo demandado. Então, por isso que eu digo, depende muito do movimento que a economia vai ter.