O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma nesta quarta-feira (20) o julgamento do recurso do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) contra a revisão da vida toda. A sessão está agendada para começar às 14h, porém, há outros três processos à frente. A expectativa é de que a decisão final seja conhecida na quinta-feira (21).
A tese, aprovada pelo STF em dezembro de 2022 por uma margem apertada de 6 votos a 5, visa incluir contribuições previdenciárias mais antigas no cálculo da aposentadoria, possibilitando um benefício mais significativo.
Atualmente, o governo busca limitar os efeitos dessa decisão. Os ministros irão analisar os embargos de declaração da Advocacia-Geral da União (AGU), um recurso que questiona parte da decisão e solicita esclarecimentos sobre a mesma.
O que é a revisão da vida toda
A revisão da vida toda possibilita uma nova abordagem no cálculo das aposentadorias, considerando todas as remunerações do trabalhador, inclusive aquelas anteriores a julho de 1994, data quando foi implementado o Plano Real.
Basicamente, é um processo jurídico pelo qual os aposentados do INSS solicitam a inclusão de salários antigos, pré-Plano Real, no cálculo de suas aposentadorias. Este direito é aplicável aos segurados aposentados há menos de 10 anos, desde que sob as regras anteriores à reforma da Previdência estabelecida pela emenda à Constituição 103 em 13 de novembro de 2019, e cujos benefícios tenham sido concedidos de acordo com a lei 9.876 de 1999.
A controvérsia em torno do direito à revisão da vida toda decorre das mudanças introduzidas pela reforma da Previdência de 1999. Antes, eram considerados para o cálculo do benefício somente os salários dos 36 meses (três anos) antes da aposentadoria. No entanto, a partir de 1999 passaram a ser considerados todos os rendimentos. Porém, foi criada uma regra de transição, que previa desconsiderar os salários antes da adoção do real como moeda, para evitar a complexa correção monetária sobre os planos econômicos anteriores.
No entanto, a tese aprovada pelo STF em dezembro de 2022 aceita a possibilidade de pedido de recálculo para os aposentados que tenham contribuições anteriores a julho de 1994, para que eles possam optar pelo valor mais favorável — se recebiam salários maiores antes desta data do que receberam depois, é possível que a média fique maior. No entanto, a legislação brasileira determina que um pedido de revisão da aposentadoria só pode ser feito dentro do prazo de 10 anos após o recebimento da primeira parcela. E a revisão da vida toda também não valerá para quem já se aposentou com as regras da reforma da previdência mais recente, em 2019.
Esse processo de recálculo pode alterar os valores dos benefícios de muitos aposentados e pensionistas, tendo impacto nas finanças públicas.
Decisão em 2022 e recurso
Em dezembro de 2022, o Supremo validou a revisão da vida toda e permitiu que aposentados que entraram na Justiça possam pedir o recálculo do benefício com base em todas as contribuições feitas ao longo da vida. Pela decisão da Corte, ficou reconhecido que o beneficiário pode optar pelo critério de cálculo que renda o maior valor mensal, cabendo ao aposentado avaliar se o cálculo da vida toda pode aumentar ou não o benefício.
Segundo o entendimento, a regra de transição que excluía as contribuições antecedentes a julho de 1994, quando o Plano Real foi implementado, pode ser afastada caso não seja vantajosa ao segurado.
Apesar do entendimento do STF, a revisão da vida toda ainda não é aplicada devido a um recurso do INSS. O órgão entrou com o recurso para restringir os efeitos da validade da revisão.
O INSS quer excluir a aplicação da revisão a benefícios previdenciários já extintos, decisões judiciais que negaram direito à revisão conforme a jurisprudência da época e proibição de pagamento de diferenças antes de 13 de abril de 2023, data na qual o acórdão do julgamento do STF foi publicado.
O que vale mais
Segundo os institutos, para saber se vale a pena entrar com a ação é importante simular o cálculo e verificar o que é mais vantajoso com um especialista: o cálculo do INSS ou o cálculo com todo o período contributivo. Quem recebeu baixos salários antes de julho de 1994 pode não obter vantagem econômica na revisão, por exemplo.
Os especialistas observam que também vale lembrar que somente poderão revisar seus benefícios aqueles que tiveram o início dos pagamentos nos últimos 10 anos, em razão do prazo decadencial. Pensionistas e quem recebeu auxílio-doença também podem ter direito. Como resultado da ação, o beneficiário pode rever a renda atual e receber os atrasados dos últimos cinco anos.
Outros dois processos
Além da revisão da vida toda, a corte deverá analisar outras duas ações de 1999 que discutem a constitucionalidade do fator previdenciário, podendo representar obstáculos para a tese.
Esses processos foram colocados na pauta pelo presidente da corte, Luís Roberto Barroso, após um período de espera de 25 anos por uma resposta. Barroso argumenta que, caso a constitucionalidade do fator seja declarada, a revisão da vida toda não seria viável.
O ministro relator, Alexandre de Moraes, pediu destaque em novembro do ano passado, levando o caso para o plenário físico e reiniciando o processo. Todos os ministros terão que se manifestar, inclusive aqueles que já votaram, que podem mudar seus votos.
O recém-empossado ministro Flávio Dino não poderá votar devido à impossibilidade de se manifestar sobre um processo em que sua antecessora, Rosa Weber, já deu seu parecer. No entanto, Dino poderá se manifestar sobre as outras duas ações.
Moraes, relator do processo, sugere estabelecer um ponto de referência temporal para permitir que os aposentados escolham a regra de aposentadoria mais favorável, sugerindo 1º de dezembro de 2022 como referência, data em que o STF julgou o mérito da ação.
Rosa Weber também apoia a modulação dos efeitos, porém, defende como marco o dia 17 de dezembro de 2019, quando o Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou o direito à correção para os aposentados. Edson Fachin e Carmén Lúcia concordam com o voto de Rosa.
O placar quando desta última suspensão era de quatro votos favoráveis a manter a decisão de 2022 — Moraes, Rosa, Edson Fachin e Cármen Lúcia — e três para anulá-la — Zanin, Luís Roberto Barroso e Dias Toffoli.
O que é esperado
Quanto aos possíveis desdobramentos, qualquer ministro pode solicitar mais tempo para analisar o caso, o que também pode acontecer nas outras duas ações que serão julgadas em conjunto. A corte também pode aceitar parcial ou totalmente o recurso da AGU, enviando a revisão de volta ao STJ, ou o recurso pode ser negado, favorecendo os segurados.
Para tentar conter os pagamentos, o INSS argumenta que, se a revisão for aprovada pelo STF, o instituto teria que revisar 88 milhões de benefícios concedidos entre 1999 e 2019, resultando em um gasto estimado em mais de R$ 380 bilhões.
Um estudo indica que, de acordo com o CNJ (Conselho Nacional de Justiça), atualmente existem 61.411 ações judiciais discutindo a revisão da vida toda.
De acordo com cálculos apresentados pelo Instituto de Estudos Previdenciários (Ieprev), embora aproximadamente 2,6 milhões de benefícios possam ser afetados pela correção, apenas 382,7 mil teriam direito. Nesse cenário, o gasto para pagar os segurados seria em torno de R$ 3 bilhões.