
Era uma amiga nossa, da época do colégio. Morava em um apartamento pequeno, mas era dela. Quitado. Hoje os jovens não consideram a posse um benefício, mas quem nasceu nos anos 1960 sabe que ter um imóvel para chamar de seu era o objetivo de uma vida – que nossa amiga só atingiu aos 50 anos. Por isso, o espanto quando ela um dia nos chamou em sua casa para anunciar que iria morar com o homem que havia conhecido no Tinder. Colocaria seu apartamento à venda.
Foi um rebuliço. Tá louca? Você não pode vender o único lugar que tem para voltar! Bom, aí começou uma conversa difícil sobre a nossa falta de otimismo em seu namoro. Estávamos apenas sendo previdentes, mas ela se defendeu: tudo ia muito bem com o casal, não eram crianças, já haviam passado por casamentos anteriores e ela não seria tola de dar um passo desses se não estivesse absolutamente confiante.
Deveríamos ter dado os parabéns e saído de fininho, envergonhadas pelo nosso ceticismo, mas continuamos bem sentadas onde estávamos e insistimos para ela não vender, e sim alugar o apartamento, e que fosse cuidadosa com o contrato, deveria incluir uma cláusula que facilitasse sua recuperação em caso de emergência. “Emergência que não haverá”, disse ela. Era comovente.
Resultado: não houve, mesmo, necessidade nenhuma de voltar para o seu apartamento. Ela e o marido continuam tão apaixonados como estavam 13 anos atrás, quando iniciaram um romance de dar inveja em amigas agourentas. O casamento segue firme e forte, e eles trabalham duro, mesmo já em idade de se aposentar, o que seria motivo para ela querer torcer nosso pescoço, pois se tivesse vendido o apartamento naquela época, teria capital para investir em um negócio próprio e talvez estivesse vivendo hoje com mais folga no orçamento.
No entanto, ela alugou o apartamento, como sugerimos. Somos cinco melhores amigas, e nossas vozes, juntas, fazem diferença na vida uma da outra. Pois bem: depois de muitos anos sendo ocupado por locatários diversos, o apartamento acaba de voltar às suas mãos. Não, nossa amiga não se separou: quem separou foi sua filha mais nova, que lá instalou suas roupas e os planos incertos para o futuro.
O apartamento continua pequeno, e agora quem o visita são as amigas da jovem inquilina, todas na faixa dos 30, que defendem, com razão, que é preciso desapegar de bens materiais, que desta vida nada se leva, que ninguém pode adivinhar o dia de amanhã, que investir em experiências é mais enriquecedor do que se matar trabalhando para ser dono de um imóvel, e eu tenho muita simpatia por essa linha de pensamento, talvez pensasse assim se pertencesse à Geração Z e tivesse nascido em 1997.
Porém, nós, Baby Boomers da pré-história, preferimos os finais felizes.