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Quando criança, ficava intrigada com os concursos de miss. Diante da tevê, pensava: como é que os organizadores descobriram que essas são as mulheres mais lindas do universo? Bateram de porta em porta em todas as casas do mundo? Quem as comparou com as que residem em vilas, aldeias, municípios distantes?
Se uma mulher seria eleita a mais bela, eu achava imprescindível que tivessem avaliado todas – TODAS! – as outras. Meu conceito de justiça era implacável.
Até que me toquei que existia algo chamado inscrição, teste para seleção, etc, mas, ainda assim, custava a relativizar, pensava em como se sentiria a mulher que realmente fosse a mais bela de todas, esquecida atrás do balcão de um bar de estrada.
Hoje, livre desta inocência infantil, relaxo e aplaudo premiações, sabendo que são fruto de mérito + lobby, e tudo certo, isso não tira o valor do reconhecimento público. Sou mais uma a se empolgar com as conquistas de Ainda Estou Aqui, filme necessário neste mundo que anda substituindo verdades verdadeiras por verdades inventadas.
E por Fernanda Torres atrair todos os holofotes, como fez Rebeca Andrade nas Olimpíadas. O planeta está avisado, somos ricos em diversidade de talentos, não dependemos apenas de artilheiros.
Antes de ser colunista, fui publicitária, uma profissão que valoriza prêmios. Nos anos 1980, quando trabalhava como redatora, o sonho de todo profissional de criação era ganhar um Leão de Ouro em Cannes. Valorizávamos os troféus e os títulos de melhor isso, melhor aquilo. Muito ego envolvido. Não enxergávamos o que de fato éramos, apenas fazedores de anúncios.
Com o tempo, passei a concordar com Adélia Prado, que um dia escreveu que todo prêmio ultrapassa o bem que se fez. Porém, quando o premiado carrega um país inteiro junto, fica difícil se manter racional.
Antes de pisar em Los Angeles, Fernanda Torres já era o máximo, não havia brasileiro que não vibrasse a cada vez que ela surgia nas telas. Agora ela comove plateias estrangeiras atuando em português, e atuando em silêncio também, como mostra a já clássica cena da sorveteria, no filme de Walter Salles.
De quebra, esbanja humor nos talk shows, não precisa de claque: está ensinando os gringos a rirem espontaneamente. É um baile. Não há como ficar indiferente.
Que Fernanda molhe os pés, umedeça a nuca e se jogue neste mar de prêmios, que ela nade de frente e de costas, e quando cansar de tanta consagração, que boie de braços abertos, olhe para o céu e aceite, calmamente, que com Oscar ou sem Oscar, o mundo enxergou melhor o Brasil e descobriu do que é capaz a filha da colossal Fernanda Montenegro. O que tinha que ser já foi, agora estou curiosa apenas para ver o vestido.