Eleito o "maior baterista do rock" pelo crítico musical Robert Christgau, um dos mais renomados dos Estados Unidos, Charlie Watts fez história na percussão dos Rolling Stones. O músico, que morreu nesta terça-feira (24), aos 80 anos, tinha forte referência do jazz e era conhecido pelo estilo próprio de tocar o instrumento.
Com uma personalidade artística muito mais sóbria que a dos companheiros de palco, o baterista era o ponto de equilíbrio do grupo. Paul Stanley, guitarrista e vocalista do Kiss, o definiu como "a espinha dorsal" dos Stones.
Dos grandes clássicos aos lados B, sua genialidade fica nítida ao ouvir o repertório da banda britânica. Para lembrar a importância do músico para o rock, GZH convidou os gaúchos Biba Meira, ex-baterista do DeFalla; Gabriel Boizinho, ex-Cachorro Grande; Kiko Freitas, eleito em 2019 o melhor baterista de world music pela revista Modern Drummer; e Sady Homrich, da banda Nenhum de Nós, para selecionarem as músicas mais especiais da discografia dos Stones, pelo ponto de vista da percussão de Watts.
Confira, abaixo, as escolhas de cada músico e seus comentários.
Biba Meira
Ruby Tuesday
"Baita batera que valoriza as partes de uma música. O bacana é que ela entra só no refrão, intensificando a melodia e impulsionando a música pra cima, dando um superembalo. É um refrão com bastante rolos de caixa. Ele não se limita a fazer uma levada simples de bumbo, caixa e xipô (bumbo, caixa e xipô são partes do instrumento). É um ritmo com mais notas e rolos de caixa, que torna o arranjo de bateria bem original e mais dinâmico."
Paint It Black
"A batera de Paint It Black é daquelas que fazem toda a diferença em uma música. Um ritmo bem forte e potente no começo, onde ele toca com tons, tocando o ritmo com uma pegada mais intensa e com timbres mais graves. Quando entra o refrão, vai pra condução de xipô, caixa e bumbo, dando aquele embalo clássico do rock."
Gabriel Boizinho
Gimme Shelter
"Essa é pela simplicidade. Ele faz na música inteira o mesmo som. É sempre a mesma coisa."
Brown Sugar
"Nessa, a bateria leva a música. Tu não percebes muito, mas é isso: sem a bateria, não tem música."
Kiko Freitas
Start Me Up
"Esta é uma música em que acho muito interessante a bateria de Charlie Watts. Especialmente na introdução, após o riff inicial de guitarra, a entrada de Charlie com abertura de hi-hat no terceiro tempo, bumbo no quarto tempo e caixa no primeiro tempo do compasso seguinte da música – gerando uma inversão de groove. É algo inusitado, inesperado e que gera complexidade sem perder a simplicidade do rock."
Dance (Pt 1)
"Neste tema, Charlie Watts consegue trazer a atmosfera das antigas discotecas para o mundo do rock, com som cru e acústico, sem o exagero tecno e sem subgraves em excesso. A condução dobrada de hi-hat, bumbo contínuo e a combinação com a percussão, inclusive incluindo a cuíca brasileira na faixa, dão um toque genial à música."
Sady Homrich
Sympathy For The Devil
"É um groove fora do normal para o rock da época e até para o que ele costumava fazer, é uma levada de borda e aro (partes do instrumento). É bacana porque isso foi em 1968, ou seja, ainda tinha aquela história de quem era mais legal, Beatles ou Rolling Stones, e essa levada contou muitos pontos para Sir Charlie Watts. E o mais bacana é que, com uma noção muito grande do que foi o crescimento dos Rolling Stones, que começou a fazer shows em arenas, ele fez outra batera para a mesma canção, uma para o disco e outra para o ao vivo. Simplificou, tirou várias notas, deixou o vocal e as guitarras fazerem o "serviço" e focou em um groove mais dançante."
Can't You Hear Me Knocking
"Esse é um groove mais pungente, não é aquela canção que tu vais ouvir e perceber logo que são os Rolling Stones. Ela tem uma baita parte de percussão no meio e, quando volta, volta com uma onda mais Santana (Carlos Santana, guitarrista)".