
Vi o rock virar adulto. Vi o punk gritar nos porões. Vi gente desafiar a ordem com guitarras, palavrões e raiva. Eram sujos, barulhentos, mal-educados — e profundamente rebeldes.
Recentemente, o CEO da OpenAI, aquela que criou o ChatGPT, declarou que palavras como "por favor" e "muito obrigado" aumentam significativamente o custo energético da inteligência artificial. Isso mesmo: gentileza consome watts. São bilhões de letras que precisam ser processadas por dia. Isso custa milhões de dólares.
A afirmação me pegou. Não só pelo dado técnico, mas pelo que carrega de simbólico.
Outro dia perguntei para uma IA se fazia diferença usar as “palavras mágicas” que aprendemos com nossos pais e deveríamos ensinar aos nossos filhos. A resposta foi fria e lógica: “tanto faz”. A máquina não se ofende, não sente gratidão, não precisa de cortesia. Pedir com jeito ou de forma direta e seca dá no mesmo. Por enquanto.
Logo, aposto, começarão a pesar na fatura. E quando esse dia chegar, corremos o risco de sermos orientados a cortar os bons modos dos nossos prompts. Nós é que somos treinados pela IA e não vice-versa, como creem os incautos. Quem sabe até apareça uma notificação: "Seu 'obrigado' está fora do plano básico."
Pode até virar roteiro de Black Mirror. E aí mora o perigo. Porque se a gente parar de usar “por favor” com a máquina, logo esquecerá de usar com as pessoas. Não é só o algoritmo que poupará energia. É a sociedade inteira que entrará em modo de economia afetiva.
Palavras como “bom dia”, “com licença”, “muito obrigado” não são apenas gentilezas automáticas. São os fios invisíveis que ainda mantêm alguma coisa de humano entre a pressa, a produtividade e o ruído.
Elas custam energia e exigem um tempo que talvez pareça improdutivo. Mas são uma forma de resistência. Um lembrete de que nem tudo precisa ser otimizado, apressado, comprimido.
Então, faça o oposto do que esperam de você. Seja rebelde: seja gentil. Digite por favor, mesmo quando a IA diz que tanto faz. Agradeça, mesmo que a máquina não dê bola.
Em tempos de eficiência absoluta, talvez a rebeldia esteja justamente aí: no que nos resta de delicadeza.