
A palavra anistia carrega um sentido profundo: o de superação de um trauma nacional em nome de algo maior. Foi assim — ainda que até hoje motive polêmica — em 1979, quando o país buscava uma saída negociada para o fim do regime militar e dava os primeiros passos rumo à redemocratização. Mesmo naquele contexto, a anistia é debatida até hoje, porque muitos a veem como um pacto de impunidade.
Se aquela anistia, feita num momento de transição histórica, até hoje divide opiniões, o que dizer de uma anistia proposta agora, num cenário em que o Estado Democrático de Direito não está em transição — está, ao contrário, tentando se proteger.
Em tempos de polarização, é difícil manter o olhar amplo quando tudo nos empurra para reações impulsivas, alinhadas com um dos lados do cabo de guerra ideológico. Mas é justamente nesses momentos que precisamos pensar na floresta — e não apenas na árvore.
A proposta de anistia aos envolvidos nos atos de 8 de Janeiro é um tiro no pé no país. Não porque o STF, o Congresso e o governo Lula mereçam aplausos irrestritos. Longe disso. Mas anistiar quem depredou Brasília é deixar a porta escancarada para que isso volte a acontecer — de outra forma, com outros protagonistas.
A anistia hoje reduziria a polarização? Diminuiria o radicalismo? Construiria pontes de reconciliação entre os campos em conflito? Não. Ao contrário: teria tudo para acirrar ânimos, aprofundar divisões e sinalizar que, em certos contextos, atacar as instituições democráticas é um risco que vale a pena correr.
Hoje, a anistia poderia parecer um gesto de perdão. Depois, será o argumento jurídico perfeito para justificar novas invasões e novos ataques — vindos de onde vierem: da direita, da esquerda ou de fora do país.
Criticar com veemência as instituições democráticas é um dever. Atacá-las de forma violenta é um crime grave.
O custo de uma eventual anistia não se pagará agora, mas lá na frente, quando menos esperarmos.
A anistia, agora e desse jeito, não será paz. Será permissão.