Uma das propostas do governo para equilibrar as contas públicas é cortar os supersalários — aqueles que excedem o teto constitucional, que é o subsídio de ministro do Supremo Tribunal Federal, sem adendos. Proposta inócua, porque ninguém conseguirá conter o ímpeto das carreiras jurídicas para driblar o teto salarial com verbas indenizatórias nascidas da imaginação fértil de quem está sempre buscando um jeito de engordar os contracheques.
Mesmo que se aprove uma emenda constitucional estabelecendo que os penduricalhos só poderão ser criados por lei federal, o que já existe vai continuar, em nome do “direito adquirido”. A emenda prevê acabar com uma das fontes de iniciativas destinadas a reforçar os ganhos de juízes e promotores, que depois se estendem a todas as carreiras jurídicas. Essa fonte é a possibilidade de os conselhos instituírem benefícios, que depois são implementados por resolução, sem passar pelo Legislativo.
A última é a chamada licença compensatória para juízes e promotores que já ganham um adicional de excesso de acervo. Apesar de terem dois meses e férias, mais o recesso, magistrados e membros do Ministério Público agora têm direito a mais uma licença de 10 dias que, pasmem-se, pode ser “convertida em pecúnia”. Ou seja: a licença é para descansar o corpo e a mente, sobrecarregados pelo excesso de processos, mas... pode ser transformada em dinheiro, como se isso aliviasse o estresse.
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul pretende implementar a licença compensatória por meio de projeto de lei, mas é forte a pressão dos juízes para que o benefício seja adotado por resolução administrativa. O argumento é que a dita licença nasceu no Conselho Nacional do Ministério Público e já está valendo nos Tribunais de Justiça da maioria dos Estados. E, em nome da isonomia, se os membros do MP recebem, os do Judiciário também têm direito. Outros penduricalhos percorreram o caminho contrário. Nasceram no Conselho Nacional de Justiça e se espraiaram para as demais carreiras jurídicas.
Temendo o freio da emenda constitucional que tenta disciplinar os benefícios que fazem explodir o teto, o Tribunal de Contas do Estado correu a aprovar uma resolução que garante a licença compensatória a seus membros. Na justificativa está a isonomia com os magistrados.